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TICs buscam jovens que saibam nuvem e cyber, mas sofrem para reter talentos em briga global

Instituto Locomotiva mostra paradoxo entre demanda por altos conhecimentos e falta de preparo de jovens com opções mundiais.

O mercado de Tecnologia da Informação e Comunicação vive um paradoxo. Enquanto 82% das empresas planejam aumentar suas equipes nos próximos dois anos, com quase metade delas priorizando posições de entrada, cresce entre os jovens a rejeição ao emprego formal, impulsionada pela percepção de que o modelo tradicional não garante boas condições de trabalho, especialmente salariais.

Um estudo do Instituto Locomotiva, patrocinado pela Brasscom e pela Fundação Telefônica Vivo, reforça a compreensão de que a força está com os novos profissionais, uma vez que a carreira não é mais sinônimo de anos na mesma empresa.

“Estamos falando de poder. O capitalismo venceu, mas agora vale para todos. O trabalhador passou a se perguntar se precisa mesmo de um chefe. E isso muda a relação entre contratado e contratante”, disse o comunicador, escritor e presidente do Instituto Locomotiva, Renato Meirelles, ao apresentar os números nesta quarta, 27/8, durante o Brasscom TecFórum Educação & Emprego, em São Paulo.

O estudo mapeou os principais gargalos na contratação de profissionais juniores: 24% das empresas apontam falta de qualificação técnica, 18% citam a ausência de experiência prévia em tecnologia e 10% destacam a alta competitividade do setor. Entre os conhecimentos mais demandados estão computação em nuvem, segurança cibernética e inteligência artificial — justamente os que as empresas apontam como mais difíceis de encontrar.

“O grande gargalo, a grande demanda está aqui, no estágio, nos jovens aprendizes, no trabalhador júnior que está tendo que aprender algo. E esses profissionais são aqueles que entram tendo a demanda de botar a mão na massa. Só que as formas de botar a mão na massa estão mudando na velocidade da tecnologia muito mais rápida do que a velocidade de aprendizado das pessoas. A dificuldade é como formar nesse cenário”, afirmou Meirelles.


O que fica claro é o predomínio do conhecimento técnico, as hard skills, entre as prioridades dos recrutadores. Computação em nuvem é prioritária para 94%, seguida por formação técnica em tecnologia (88%), segurança cibernética (80%) e inteligência artificial (80%). Outras habilidades técnicas valorizadas incluem certificações específicas (78%), infraestrutura de TI (78%) e proficiência em inglês (76%). Até mesmo competências mais tradicionais, como pacote Office (72%) e automação e desenvolvimento (68%), aparecem bem classificadas.

Como diz o estudo, se encontrar esses profissionais não chega a ser tarefa impossível, somente 10% das empresas considera fácil contratar na área de TI. A pesquisa também mostra que formação técnica (88%) aparece à frente da formação superior (66%) como requisito prioritário, evidenciando que o mercado busca profissionais preparados para atuar rapidamente, sem necessariamente exigir diploma universitário.

Já no campo das soft skills, como proatividade (50%), resolução de problemas (48%) e vontade de aprender (40%), os números mostram que essas competências são vistas como importantes, mas não aparecem entre as prioridades imediatas de contratação. Habilidades como comunicação (20%) e capacidade de aprender sozinho (22%) são ainda menos priorizadas, embora reconhecidas como desejáveis.

Na avaliação de Meirelles, o problema exige respostas rápidas e coordenadas. “A tecnologia evolui mais rápido do que a capacidade de aprendizado. Esse jovem vai entrar para ‘botar a mão na massa’, mas se não tiver qualificação mínima em nuvem, segurança ou automação, a empresa não consegue aproveitar. É preciso formar de forma contínua e prática, ao mesmo tempo em que se desenvolvem as chamadas soft skills”, disse.

Para tentar reduzir o descompasso, as companhias têm apostado em múltiplas estratégias — em média seis por empresa. Entre as mais efetivas estão as parcerias com instituições de ensino técnico, bootcamps, programas de inclusão de minorias e flexibilização de critérios de seleção. Já na retenção, planos de carreira, pacotes de benefícios e programas de desenvolvimento interno são considerados os mecanismos mais eficazes.

Apesar dos obstáculos, o potencial de mobilidade social atrai jovens para o setor. Segundo o Locomotiva, um estudante de escola pública que conclui formação técnica em TI pode alcançar, em poucos anos, salários superiores aos dos pais. O risco, alerta Meirelles, é que empresas e políticas públicas não acompanhem o ritmo da transformação. “A carreira deixou de estar vinculada a uma empresa e passou a estar vinculada às oportunidades. O desafio é garantir que o Brasil forme e retenha esses talentos no ritmo em que a economia exige.”

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