Para além da guerra da saúde pública, não adiem o leilão do 5G
Os líderes vencedores da Segunda Guerra Mundial (1939 a 1945) não esperaram o seu final para planejar os dias seguintes. Em 1941, Franklin Roosevelt e Winston Churchill publicaram a Carta do Atlântico, que precedeu a Organização das Nações Unidas. Em 1942, no Reino Unido foi publicado o Relatório Beveridge, documento que visou o bem-estar universal. Em 1944, a Conferência de Bretton Woods forjou o gerenciamento econômico internacional do pós-guerra. Hoje, tais tipos de planejamento se fazem necessários, para além da guerra da saúde pública provocada pelo Covid-19.
O que se vê pelo mundo! O que começou em 2019 como uma emergência na área de saúde rapidamente se transformou em uma crise econômica mundial. As medidas de contenção da pandemia abalaram os principais pilares da economia global: a demanda, a oferta e as finanças. Portanto, ações estratégicas são fundamentais não somente para conter a propagação do novo vírus, mas também para minimizar os impactos sócio-político-econômicos.
As medidas de distanciamento social significaram atividade comercial reduzida. Assim, a indústria foi afetada pelos efeitos colaterais da demanda e da oferta. Uma combinação de renda mais baixa e o temor de contágio resultaram em redução dos gastos privados, parcialmente compensados com aumento de gastos públicos. A produção industrial está prejudicada pela falta de suprimentos intermediários. A interrupção do comércio e o seu impacto nas redes internacionais de produção e nas cadeias globais de valor precisam de atenção.
Governos promovem medidas de alívio da dívida e oferecem programas de adiamento de negócios. Resta saber quantas empresas conseguirão absorver as perdas acumuladas e sobreviver, supostamente ilesas, à pandemia.Diferentes impactos são observados nas indústrias, empresas e famílias, entre os diversos países. No nível nacional, várias medidas políticas preventivas tentam salvar vidas, fornecer apoio para que as empresas permaneçam ativas, proteger o emprego e acelerar a economia para enfrentar a crise.
As indústrias locais envolvidas no aumento da produção de bens mais necessários, como produtos alimentícios (a garantir autossuficiência alimentar), produtos para saúde, tecnologia da informação e comunicações (TIC), e insumos para a fabricação local seriam as vencedoras, se garantirem receitas. Várias empresas do setor manufatureiro redirecionam linhas de produção, as adaptando para bens que se fazem prementes, como ventiladores, máscaras e unidades de terapia intensiva. Muitas empresas também reorganizam seus negócios para utilizar o tele trabalho e o comércio eletrônico.
No nível macroeconômico, os governos adotam políticas, incluindo ajustes na taxa de câmbio e da balança de pagamentos, políticas monetárias e medidas fiscais. Mas, soluções no nível microeconômico também são necessárias, pois a escala do atual choque de oferta (forçada pela atividade econômica) é um desafio sem precedentes.
Para manter as empresas ativas, os governos introduzem ações para garantir liquidez para que os empresários possam enfrentar desafios imediatos de fluxo de caixa e a continuidade dos negócios. Isso inclui o alívio temporário da dívida e a compensação por meio de linhas de crédito. Além de adiar o pagamento de impostos, tributos e outras taxas governamentais.
Para manter o emprego e, assim reter funcionários, são adotadas regras, tais como suspensão temporária dos contratos de trabalho, que são introduzidas para evitar demissões em larga escala, com arranjos alternativos de trabalho, incluindo licença de curto prazo, tele trabalho e compartilhamento de custos mediante ajustes salariais parciais.
As empresas, que ainda não o faziam, passaram a adotar outros meios de fazer negócios, como por exemplo: presença na rede mundial de computadores, anúncios nas mídias sociais, reforço no atendimento ao cliente via telefone e on-line, e uso de comércio eletrônico. De forma a futuramente blindar o setor, governos e empresários precisam promover iniciativas para que a produção permaneça em um terreno mais sólido em caso de interrupções na cadeia de suprimentos. Isso inclui a reorientação logística a menores distâncias e ênfase no desenvolvimento da cadeia doméstica de suprimentos (local content).
Haverá necessidade de ações de anti-globalismo no que diz respeito à supply chain. A escalabilidade desejada nos modelos de negócios para o mercado global precisará de salvaguardas, de modo a evitar dependências monopsônicas. A dramática dependência mundial a duas grandes nações, quanto aos insumos fármaco-médico-hospitalares, poderá provocar re-industrialização regional, principalmente nas áreas farmacêutica, equipamentos de proteção individual e eletromedicina.
O setor de telecomunicações, instrumento de desenvolvimento de um país, quando bem dimensionado e modernizado, mitiga o distanciamento econômico-social, principalmente por ser um setor independente da atividade econômica e o meio fundamental de transporte para outras atividades econômicas. E no Brasil? Bom, o que se lê nas linhas acima, de alguma forma, também ocorre no País. O distanciamento social aumentou o acesso aos serviços de TIC, via redes de telecomunicações, cuja sobrecarga tem sido suportada até aqui.
Mas reforcem essas redes com tecnologia mais avançada para prover serviços de baixa latência. Dessa forma, não se postergue o leilão das redes ditas de quinta geração (5G). Atenção para a segurança cibernética, que ao gerar uma grande ação de proteção de dados e pessoas, trará significativa demanda por serviços de TIC. Muito cuidado com as áreas de bem-estar social (bolsa família, SUS, programas de renda mínima etc.), e foco na telemedicina (automatização de prontuários médicos, monitoramento de pacientes, laudos e até cirurgias à distância).
* Juarez Quadros do Nascimento é Engenheiro Eletricista e ex-ministro de Estado das Comunicações.