A nuvem que transforma
Todo início de ano é marcado por planos e expectativas para o novo ciclo, seja em nossas vidas pessoais ou profissionais. No entanto, proponho hoje um exercício diferente: antes de olharmos para frente, vamos olhar para dez anos atrás.
Como era a sua vida? Talvez você já estivesse no mesmo emprego, mas certamente muitas de suas atividades diárias eram diferentes. Você não resolvia toda a sua vida financeira via aplicativo do banco; não assistia filmes por streaming; não renovava a carteira de habilitação ou consultava seus dados de vacinação digitalmente; nunca havia passado por uma consulta virtual com seu médico; e, provavelmente, não havia tido a experiência de estudar ou trabalhar a partir de sua própria casa.
Na fundação de todas essas mudanças que deixaram nossa vida mais digital nos últimos dez anos está a computação em nuvem, uma tecnologia que permite o armazenamento, o processamento e a análise de dados em grande escala e com agilidade. Mais do que nos poupar uma indesejada ida ao banco, a nuvem proporcionou a democratização de dados, redução de prazos e de custos de atividades de grande impacto social, como o desenvolvimento em tempo recorde de vacinas contra a Covid-19. O período de execução de um sequenciamento genético, por exemplo, cai de 12 horas para 1 hora com o uso da computação em nuvem.
A nuvem ainda favorece a adoção de novas tecnologias, como a inteligência artificial e o machine learning, ampliando as possibilidades de inovação em todos os setores da economia. Vejamos o caso da saúde. O hospital Sírio-Libanês, de São Paulo, combinou a internet das coisas, a análise dos dados e machine learning para prever os pacientes da UTI que corriam um possível risco de sepse, sendo capaz de tomar as medidas adequadas com antecedência para salvar vidas. Outra iniciativa que já está mais disseminada pelos hospitais do País é o monitoramento remoto dos pacientes, solução que reduz custos, torna o processo de recuperação menos invasivo e oferece aos médicos resultados mais precisos e imediatos.
Se a saúde está se transformando para ser capaz de olhar para cada paciente de forma personalizada, a educação também está. Os modelos de educação de grande escala em que todos os alunos são vistos como uma massa uniforme estão ficando no passado e cedendo lugar ao ensino adaptativo. Grandes grupos educacionais e Edtechs (muitas delas nascidas na nuvem) são cada vez mais movidos por dados e criam novas soluções para atender às mais diversas necessidades dos alunos, seja a dislexia ou a preparação adequada para ingressar em um curso específico de uma determinada faculdade.
A partir da nuvem, a Edtech de ensino digital Descomplica oferece mais de 27.500 vídeos focados em reforço escolar e universitário, pré-vestibular e certificações profissionais, e consegue realizar simulados online para 100 mil pessoas simultaneamente. Para superar o impacto do isolamento social durante a pandemia de Covid-19 em seus alunos, a Somos Educação ampliou significativamente a capacidade de sua plataforma online e em poucos dias foi capaz de atender a 1,3 milhão de estudantes de escolas parceiras com aulas remotas.
Nem as ONGs ficaram de fora. A Gerando Falcões, instituição que promoveu um trabalho louvável de suporte às comunidades durante a pandemia, migrou suas cargas de trabalho para a nuvem com o objetivo de tornar mais precisas a coleta e a análises de dados nas comunidades, ampliando seu impacto social. Mesmo no setor público, onde a adoção de novas tecnologias tende a ser mais lenta, vimos mudanças expressivas nos últimos anos, aceleradas especialmente em razão da Covid-19.
Os números comprovam: um estudo da consultoria IDC sobre a transformação digital no setor público da América Latina mostrou que o atendimento presencial passou de 71% no pré-pandemia para 39% hoje. Os métodos remotos, por sua vez, cresceram: telefone (de 15% para 20%), vídeo (de 8% para 23%) e online (de 6% para 18%).
Este é um processo que não irá parar, pelo contrário: nossa expectativa é de crescimento intenso da transformação digital nos próximos anos no Brasil, em especial em governos estaduais e municipais. Estudos mostram que apenas 5% dos gastos globais em TI são em nuvem, dado que revela que há ainda um longo caminho a ser desbravado.
Vista com desconfiança anos atrás, a computação em nuvem provou ser uma ferramenta excepcional para reinventar modelos de negócios e de prestação de serviços ao cidadão. Ela é capaz de simplificar e agilizar processos com segurança, gerando impacto social e econômico, e de apoiar iniciativas de inclusão e de redução das desigualdades.
Que daqui dez anos nós possamos olhar para 2022 e sentir orgulho do quanto avançamos neste processo de reinvenção coletiva, fazendo bom uso das tecnologias disponíveis.
Paulo Cunha é diretor para o Setor Público da AWS no Brasil