
Por Roberta Prescott*
O Banco Central do Brasil anunciou mudanças para a próxima fase do Drex. Em vez de usar blockchain, o BC focará na reconciliação de gravames. O anúncio implica adiar o uso de redes descentralizadas que levam à programabilidade do dinheiro, crédito pessoa a pessoa e demais operações financeiras sem intermediários, foi falado durante o evento Blockchain Rio, realizado no começo de agosto.
“Eu acho que esse foi o momento de vamos ser pragmáticos. De fato, para você poder garantir uma transação segura de um processo que dispara automático, acontece sozinho e é imparável, você precisa de muita segurança”, diz Wagner Martin, vice-presidente de relações institucionais da Veritran e mentor do Laboratório de Inovações Financeiras Tecnológicas (Lift Lab) do Banco Central.
De fato, em painel no Febraban Tech do ano passado, quando estava prestes a iniciar a segunda fase de testes, o consenso era de que a moeda digital brasileira ainda precisava superar o desafio da privacidade em um ambiente programável. A questão foi levantada por Clarissa Souza, coordenadora de tecnologia do Banco Central do Brasil, a mesma servidora que, ao participar de painel no Blockchain Rio, mencionou a recente mudança — informação que, posteriormente, foi confirmada pelo coordenador do Drex, Fabio Araújo, ao jornal Valor Econômico.
“Começamos o projeto em janeiro de 2023 e trouxemos um desafio de teste montando um grupo com 16 consórcios para avaliar o problema da privacidade com a programabilidade”, assinalou à época a auditora do BC, explicando que, na segunda fase, a proposta era que bancos implementassem casos de uso e tentassem usar as soluções de privacidade que o BC havia testado. A meta da segunda fase era testar a implementação de contratos inteligentes criados e geridos por terceiros participantes da plataforma.
Ao Valor, Araújo disse que “as soluções de privacidade atuais são muito boas, porém, ainda é necessário muito trabalho, desenvolvimento e adaptação para que elas se tornem parte da base de um novo sistema financeiro baseado em tecnologia descentralizada. Segundo ele, o BC avalia como boas soluções de privacidade, mas aparentemente não são suficientes e necessitam de mais testes.
Wagner Martin aponta que a estrutura da plataforma do Drex tem a capacidade de centralizar todos os gravames — registro de restrição financeira, garantias que acabam alienando bens, como veículos ou casas. Assim, na opinião do executivo, neste momento, o Banco Central optou por resolver o problema de conciliação, liquidação e de velocidade, em uma base onde tem tudo, para depois interligar isso à blockchain para automatizar.
Para Martin, o BC não descartou o uso de DLT, mas postergou a adesão à tecnologia. “O que eles fizeram aqui foi o seguinte: vamos aproveitar enquanto não temos a segurança que desejamos dentro da automatização da transação e vamos nos centrar na plataforma de centralizador de liquidação, porque ela já ajuda”, afirmou.
Após avaliar o ecossistema de tecnologia de registro distribuído (DLT, para a sigla em inglês), em 2023, o BC elegeu o Hyperledger Besu, uma DLT permissionada compatível com a linguagem de contratos inteligentes do Ethereum, para ser a infraestrutura do Drex. Uma das justificativas para a mudança teria sido privacidade — contactado pela redação, o BC não quis dar entrevista ou responder às perguntas enviadas por e-mail. “O BC tem a agenda hashtag e querem insistir até se sentirem seguros; eles se sentindo seguros conseguem acoplar no Drex a parte de descentralização”, analisa Martin.