Governo terá prazo para mudar compartilhamento de dados entre órgãos
O Supremo Tribunal Federal sinaliza que vai atender o pleito do governo federal e dar prazo para ajustes no Decreto 10.046/19, que trata do cruzamento das informações sobre os brasileiros em poder dos diversos órgãos públicos. O relator da ação direta de inconstitucionalidade (ADI 6649) que questiona o Cadastro Base do Cidadão, Gilmar Mendes, votou na sessão de quarta, 14/9, para que o compartilhamento seja o mínimo necessário, e indicou 60 dias para mudanças no decreto.
Os demais votos até aqui, de André Mendonça e Nunes Marques, acompanham na essência e divergem em dois pontos: um prazo um pouco maior, até 31 de dezembro; e se o descumprimento dos limites ao compartilhamento deve ser considerado improbidade administrativa.
A questão é ampla não só pela abrangência do decreto questionado em si, mas também uma ação de descumprimento de preceito fundamental (ADPF 695) que caminha junta e questiona um acordo pelo qual o Serpro compartilharia dados com a Agência Brasileira de Inteligência – ato depois derrubado pelo próprio governo.
O próprio governo, por meio da Advocacia Geral da União, sustentou ao Supremo, neste julgamento, que o decreto está sendo remodelado e pediu tempo para a publicação de um novo, sem interrupção da dinâmica atual. Os votos já apresentados sinalizam que a decisão vai caminhar nessa direção.
No mérito, Gilmar Mendes sustentou a “premente necessidade de exercermos, com extremo rigor, o controle de políticas públicas que possam afetar substancialmente o direito fundamental à proteção de dados pessoais” e propôs interpretação constitucional ao decreto do Cadastrão em estrita observância à Lei 13.709/18, a LGPD:
“O compartilhamento de dados pessoais entre órgãos e entidades da administração pressupõe a eleição de propósitos legítimos específicos e explícitos para o tratamento de dados, compatibilidade do tratamento com as finalidades informadas, limitação do compartilhamento ao mínimo necessário para atendimento da finalidade informada, bem como o cumprimento integral dos requisitos, garantias e procedimentos estabelecidos na Lei Geral de Proteção de Dados no que for compatível com o setor público”, conclui Mendes.
O relator também apontou uma alteração específica a ser feita no decreto, de forma a abrir o comitê gestor do Cadastrão à participação de representantes da sociedade.
“Voto ainda no sentido de declarar com efeito pro futuro a inconstitucionalidade do art 22 do Decreto 10.046, preservando a atual estrutura do Comitê Central de Governança de Dados pelo prazo de 60 dias, a contar da publicação da ata de julgamento, a fim de garantir ao chefe do Poder Executivo tempo hábil para atribuir ao órgão um perfil independente e plural aberto à participação efetiva de representantes de outras instituições democráticas e conferir a seus integrantes garantias mínimas contra influências indevidas.”
Em passo adicional no resguardo das medidas de proteção de dados pessoais, Gilmar Mendes também votou no sentido de que o descumprimento do previsto na LGPD seja causa de punição por improbidade administrativa contra o servidor público responsável pela violação. Fora a pequena divergência no prazo dos ajustes ao decreto questionado – na prática, se até novembro ou dezembro – a punição por descumprimento é rejeitada nos votos de Mendonça e Marques.