Netflix: usuário paga pela conexão e tem o direito de usar como quiser
Especialistas defendem a neutralidade de rede como um estímulo à competição.
A neutralidade de rede é necessária e estimula a competição. Assim definiram especialistas internacionais que participaram, nesta quarta-feira, 13/11, do Internet Summit: Conectividade e Inclusão para o Futuro Digital, organizado pela Aliança pela Internet Aberta (AIA). O encontro reuniu mais de 25 organizações em um diálogo sobre o presente e o futuro da infraestrutura digital brasileira, com foco na transformação e inclusão.
“Depois de dez anos do Marco Civil da Internet, vemos movimentos tentando discutir alguns de seus princípios, como a neutralidade. Algumas operadoras estão propondo uma taxa, permitindo a cobrança além do que já recebem pelo acesso”, lembrou Celina Bottino, diretora do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS).
Para o presidente do Technology Policy Institute, Scott Wallsten, revisar regras de tempos em tempos é necessário, até para confirma se ainda fazem sentido. “Isso vale para a regulação. O que é bom para uma área pode não ser para outras”, afirma. Para o executivo, a pandemia trouxe uma luz para algumas destas questões e mostrou como que outros modelos são possíveis.
Citando o exemplo dos Estados Unidos, Wallsten diz que o país subsidiou acesso à internet por muitos anos, sem medir se estes estímulos estavam funcionando ou não. “Precisamos pensar sobre o que funciona e o que sabemos que não funciona para construir e medir, ao invés de manter tudo no mesmo”, defende.
Por outro lado, a experiência na Índia mostra que algumas regras adotadas há alguns anos devem ser mantidas. De acordo com o fundador e editor da MediaNama, Nikhil Pahwa, por lá as operadoras tentaram implementar taxas há cera de dez anos, alegando que o custo da internet subiria muito para que elas mantivessem suas receitas. Nesse período, o país saltou de 342 milhões de usuários de internet para 969 milhões de usuários.
“É a maior base de internet aberta do mundo. Hoje, quase todos estes usuários utilizam conexões 4G”, diz, ressaltando que este crescimento ocorreu porque o custo, apesar das previsões, caiu. “O mesmo operador que disse que as taxas de dados aumentariam se a neutralidade não fosse removida, viu sua margem de lucro subir de 14% para 42%. O crescimento no lucro, na receita e nas margens se deu com o crescimento no volume de usuários”, compara.
Defendendo a manutenção da neutralidade da rede, o líder de política global de entrega de conteúdo da Netflix, Thomas Volmer, lembra que a internet aberta tem a ver com a escolha do usuário. “Ele paga pela conexão e pode usá-la como quiser”, diz. Falando sobre o ecossistema, o executivo acredita que ele funciona bem com as operadoras criando redes, os consumidores se inscrevem e empresas como a Netflix investem em produção de conteúdo que faz com que as pessoas usem as conexões melhores.
Ele lembrou que a Netflix investe em infraestrutura para garantir que as pessoas recebam conteúdos sem quebras. “Nos preocupamos com a internet aberta e investimos em conteúdo e infraestrutura para que ela funcione melhor”, diz, lembrando que o aumento de tráfego faz crescer a receita das operadoras. “As pessoas pagam para acessar a rede ao redor do mundo e o dever do ISP é garantir esse acesso”, diz.
Fundos devem ser mais bem utilizados
Um dos pontos da discussão foi o uso de fundos setoriais para estimular o acesso. Wallsten lembrou que, nos últimos 20 anos, os Estados Unidos investiram mais de US$ 100 bilhões para financiar o acesso universal e que há outros US$ 42 bilhões esperando para serem utilizados. “Esse fundo foi criado com impostos pagos pelos serviços de telecomunicações e nos leva a questionar o quanto gastamos todos os anos com isso”, diz.
Para o executivo, o mundo vive hoje uma nova era de conectividade, que vai além dos grupos que foram beneficiados por estas verbas ao longo dos anos. Ela cita o exemplo de novos atores do ecossistema, como a StarLink, que estão mudando a lógica do acesso. “Queremos pensar em como reduzir o custo e outros concorrentes devem surgir. É importante pensar em como levar o serviço a todos os locais”, diz.
Pahwa lembra que, na Índia, 15% dos valores recolhidos em fundos setoriais não são utilizados. “É uma questão de competição. Hoje temos duas empresas com licença para operar internet via satélite e, quando a StarLink chegar, teremos três”, revela.
Para Volmer, todas estas questões estão conectadas ao mesmo debate. Ele lembra que, na União Europeia, a universalização do serviço não é tema de discussão, mas de regulação. “O fato é que todas as empresas devem ser reguladas dependendo de seu próprio mérito”, diz, lembrando que a Netflix segue a regulação de serviço de mídia.
O executivo destacou o exemplo da Coreia, cuja regulação acabou com a neutralidade da rede. “Desde 2016 a Coreia não evolui a rede. A latência é uma das maiores do mercado. No geral, o exemplo coreano de regular o acesso não foi bem-sucedido. É muito mais inteligente oferecer os serviços que os consumidores querem”, diz, lembrando que na Índia e no Brasil os consumidores estão mais bem atendidos hoje.
Veja a íntegra do evento Internet Summit: Conectividade e Inclusão para o Futuro Digital