TCU: Estados podem usar licitações já feitas ou atas abertas em chips para estudantes

O Tribunal de Contas da União, ao responder uma consulta feita pelo Senado Federal, sustenta que os recursos federais destinados a estados e ao Distrito Federal para compra de chips para estudantes e professores podem ser usados em licitações já realizadas ou em atas de registro de preços ainda vigentes. 

“Os recursos da Lei 14.172/2021 poderão ser utilizados para ampliação de contratos já em andamento, ou para adesão de atas de registro de preços em aberto (art. 22, § 9° do Decreto n° 7.892, de 23 de janeiro de 2013), desde que verificada a sua integral aderência às regras da lei de conectividade e respeitados os dispositivos previstos na Lei 8.666/1993, ainda em vigência”, anotou o TCU. 

Ao todo, a Comissão de Educação Cultura e Esporte do Senado Federal encaminhou seis perguntas ao TCU, também abrangendo a possibilidade de contratação de conexões fixas à internet, critérios para a transferência dos recursos federais a municípios, lista de beneficiados, etc (veja abaixo). 

Trata-se, vale lembrar, de um montante de R$ 3,5 bilhões que o Congresso Nacional destinou para a conectividade de alunos e docentes, como medida paliativa por conta da pandemia de Covid-19. Jair Bolsonaro chegou a vetar o repasse previsto na Lei 14.172/21, derrubado pelo Congresso, e depois recorreu ao Supremo Tribunal Federal com o mesmo objetivo – mas o STF manteve a destinação dos recursos. 

Além de entender que o dinheiro pode ser usado em processos de compras públicas já realizados ou ainda vigentes, o TCU também respondeu que essa contratação deve privilegiar conexões móveis, e que portanto as conexões fixas devem ser tratadas como exceções. As perguntas do Senado e as respectivas respostas foram as seguintes, nos termos do voto do relator Walton Alencar Rodrigues: 


1. O § 6º do art. 3º da Lei nº 14.172/2021 prevê a aplicação excepcional dos recursos de contratação de soluções de conectividade móvel para contratação de serviços de conectividade para as escolas da rede pública de ensino. Considerando a mudança de cenário da pandemia, com o retorno gradual dos estudantes para o ensino presencial, há possibilidade de flexibilização da exceção para que os recursos sejam aplicados prioritariamente para a conectividade das escolas e como deve ser realizada a prestação de contas de estados e municípios para justificar essa flexibilização? 

Em relação a questão 1, acolho as conclusões da unidade técnica, no sentido de que a utilização prioritária dos recursos em finalidade que a lei expressamente estabeleceu como excepcional desvirtuaria o atendimento ao objetivo principal estabelecido pelo legislador. Assim, não cabe a este Tribunal modificar a vontade legislativa, devendo-se preservar o intento previsto na legislação.

Contudo, o art. 3º, II, § 6º, da Lei 14.172/2021 impôs, como exigência para o uso excepcional dos recursos, na contratação de serviços de acesso à internet, em estabelecimentos da rede pública de ensino, apenas a apresentação de justificativa por parte das secretarias de educação.

Dessa forma, a própria legislação já flexibilizou a forma de aplicação dos recursos, de modo que, em cada caso concreto, justificada a excepcionalidade, é possível a utilização de recursos para a contratação de serviços de acesso à internet para os estabelecimentos da rede pública de ensino, devendo ser mantida, porém, a prioridade legal, consistente na contratação de soluções de conectividade móvel.

Deve-se, assim, responder ao consulente que não é possível a flexibilização da exceção para que os recursos sejam aplicados prioritariamente para a contratação de serviços de acesso à internet das escolas, uma vez que a aplicação excepcional dos recursos nessa finalidade já é regulamentada, com razoável flexibilidade, na própria Lei 14.172/2021.

2. Os recursos recebidos em decorrência das transferências previstas na Lei poderão ser utilizados para ampliação de contratos já em andamento para conectividade móvel e conectividade das escolas? 

No que tange à questão 2, também acolho as conclusões da SecexEducação, no sentido de que é possível a utilização de licitação ou ata de registro de preços anterior ao repasse dos recursos, desde que respeitada a respectiva lei de licitações. Contudo, não limito tal possibilidade à Lei 8.666/1993, tal como proposto pela Unidade Técnica, que assim o fez com base no entendimento firmado pelo Acórdão 2099/2011-TCU-Plenário, relator o E. Ministro-Substituto Marcos Bemquerer, em resposta a Consulta formulada pelo então Ministro de Estado das Cidades.

Embora o precedente tenha mencionado, exclusivamente, a então única lei geral de licitações, atualmente há duas leis igualmente vigentes, de modo que ambas – tanto a Lei 8.666/1993, quanto a Lei 14.133/2021 – podem servir de baliza para a utilização de licitação ou ata anterior ao repasse dos recursos previstos na lei de conectividade, a depender de qual tenha sido a lei utilizada no edital da licitação a ser aproveitada.

3. Os planos de trabalho fornecidos ao FNDE podem ser alterados após a transferência do recurso, por exemplo, modificando os percentuais de despesas de custeio e capital? 

A questão 3, por sua vez, exige uma resposta negativa. Não é possível alterar o plano de trabalho após o seu envio ao FNDE, uma vez que não há tal previsão na lei de conectividade e seus regulamentos. 

Como se sabe, o princípio da legalidade no Direito Administrativo exige que a Administração só pratique atos explicitamente autorizados em lei. No silêncio das normas, como é o caso, não se admite a prática do ato. 

Do ponto de vista prático, tal como bem demonstrado pela unidade técnica, a questão possui pouco impacto, uma vez que os planos de ação de todos os 26 estados e do Distrito Federal já foram devidamente cadastrados pelos gestores estaduais e, após as análises de mérito e financeira pelo FNDE, foram autorizados na Plataforma +Brasil, na qual já foram gerados os respectivos termos de adesão.

Diante desse cenário e do exíguo prazo conferido aos gestores para executarem as ações previstas na lei, não é pertinente que se abra exceção, à margem da lei, para permitir a alteração suscitada na presente consulta, uma vez que isso atrasaria a entrega dos serviços e produtos aos beneficiários da política pública.

4. Considerando que a lei não definiu os critérios para transferência dos recursos dos estados para os municípios, cada ente federado poderá definir seus parâmetros de transferência? Existe óbice para que o Estado opte por não transferir o recurso para os seus municípios? 

Relativamente à questão 4, tem-se que a própria lei de conectividade facultou aos gestores estaduais a opção pela execução dos recursos transferidos por meio de cooperação com os municípios, a qual é discricionária. Contudo, em respeito aos princípios da isonomia, impessoalidade e razoabilidade, eventual opção pela participação dos municípios deve ser acompanhada de critérios objetivos e justificados, para permitir que todos os municípios interessados, desde que atendam aos requisitos estabelecidos, consigam realizar a colaboração com o respectivo estado.

5. Considerando a dificuldade em identificar os beneficiados por meio da lista do CadÚnico, uma vez que está desatualizada, existe alternativa para definir os beneficiários das ações ou poderá ser utilizada a lista com os dados desatualizados? 

Considero que a questão 5 perdeu seu objeto. Como bem salientado pela unidade técnica, a União já adotou, com base nos dados fornecidos pelo Inep, os trâmites relativos à atribuição dos valores devidos a cada estado.

Assim, considerando que não há lacunas ou obscuridade nas normas quanto à definição dos beneficiários das ações, que os recursos financeiros já foram devidamente transferidos pela União e já se encontram disponíveis, desde 10/3/2022, aos estados e ao Distrito Federal, não há que se falar em “alternativa para definir os beneficiários das ações” da lei de conectividade.

6. Diante do silêncio do Decreto nº 10.952, de 2022, sobre o prazo para que os recursos e os rendimentos não aplicados, os saldos remanescentes e os seus rendimentos sejam restituídos à Conta Única do Tesouro Nacional, como estados e municípios deverão proceder para realizar a restituição?

A questão 6 também perdeu seu objeto, como já explicitado na seção anterior, diante da alteração trazida pela Lei 14.351/2022, em seu art. 13, que prorrogou o prazo máximo de aplicação dos recursos para 31/12/2023 e o prazo de devolução dos valores não utilizados para 31/3/2024.

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