Inovação

Inteligência Artificial é carro-chefe no combate às fraudes na Via

A inteligência artificial é usada por diferentes setores da Via, dona do Extra.com, Casas Bahia e Ponto, entre outras marcas. A partir de modelos estatísticos e análises descritivas, os times de ciência de dados são responsáveis por otimizar a concessão de crédito, diminuir o número de fraudes de pagamento e ajudar a impulsionar as vendas no e-commerce.

Mas essa é apenas uma vertente das aplicações. A IA também é usada em vendas, precificação e logística, além de estar no CRM dos clientes e na parte relacionada aos sellers do marketplace. Há uma gerência de ciência de dados com três coordenações cuidando cada uma delas de uma área — e com um olhar único para as marcas. A estrutura conta ainda com uma outra área que usa IA no atendimento aos colaboradores, ou seja, no suporte interno. Recentemente, a Via colocou à disposição dos funcionários atendimento via WhatsApp por meio de robôs. 

Em entrevista exclusiva para o Convergência Digital, a coordenada de ciência de dados, Cirdêmia Costa Feitosa, deu detalhes da adoção de IA na Via para serviços financeiros, fraude e cobrança, áreas que estão sob sua responsabilidade. Um deles envolve um dos projetos mais antigos da companhia. isso porque há mais de 60 anos, a Casas Bahia oferece crédito para o consumidor brasileiro.

Na década de 1980, a concessão do crediário era feita manualmente e, segundo a companhia, seguindo um roteiro de perguntas, o cliente era classificado em apto ou não para parcelar suas compras através do carnê. No entanto, a própria empresa admite que essa avaliação estava repleta de vieses inconscientes e a decisão de concessão tinha baixa assertiva e, consequentemente, muita gente acabava tendo o crédito negado ou aprovado erroneamente.


“Após a chegada do Plano Real, no início da década de 1990, a concessão de crédito no país evoluiu e modelos estatísticos começaram a ser utilizados em larga escala, reduzindo os vieses e melhorando a assertividade na concessão do crédito, o que resultou no aumento da quantidade de créditos concedidos à população e reduzindo a inadimplência nos pagamentos”, disse Feitosa.

Hoje, a área de ciência de dados da Via tem acesso a bases de dados dos clientes, permitindo a criação de modelos estatísticos robustos. Isso fez a avaliação para concessão de crédito se transformar em algo otimizado e automatizado, eliminando possíveis erros humanos nessa avaliação e aumentando as chances de oferecer o crédito para pessoas que realmente tinham interesse e que podiam pagar por ele. Também diminuiu o tempo até o cliente ter (ou não) o seu crédito aprovado nas Casas Bahia.

Além disso, alguns modelos preditivos foram criados para o aumento da oferta de crédito confiável, que, de acordo com a Via, aumentam as chances de um atendente fazer a venda via crédito para o cliente, tornando a abordagem do vendedor da loja mais assertiva. Na parte de cobrança, o principal uso de IA está ligado à busca por uma maior assertividade. “A IA entra para reconhecer a probabilidade de o cliente rolar a dívida nos ciclos, que podem ser de 30, 60, 90 ou 120 dias, mostrando qual é a probabilidade dele cliente, que já está em dívida, de rolar para próximo ciclo”, explica a coordenadora.

Com essas informações, a Via pode insistir com aquele cliente que identificar que não adiará ainda mais o pagamento. Mas, se a probabilidade de rolar para o próximo ciclo for alta, a ferramenta apontará para as áreas de negócios a melhor forma de atuar, dando recursos para elas montarem uma estratégia. “No call center, por exemplo, meu recurso para fazer ligações é limitado, então, compensa ligar para quem tem probabilidade de pagar”, disse Cirdêmia Feitosa. 

Estratégica

A inteligência artificial também vem sendo aplicada para diminuir a probabilidade de fraudes. Com o uso de modelos probabilísticos, a Via consegue prever perfis de compras fraudulentas em seu e-commerce e com isso reduzir consideravelmente perdas financeiras. A companhia aponta que houve um aumento da precisão de detecção de fraudes de 70%. A área conseguiu tornar a aprovação do pagamento muito mais rápida, cerca de 15 mil pedidos ao mês, diminuindo os pontos de atrito na jornada de compra e, com isso, reduzindo a taxa de cancelamento de pedidos.

“Fraude é nosso carro-chefe em dados, porque é uma área sensível que temos de trazer respaldo para empresa”, disse Feitosa. Entrando em detalhes, ela explicou que é calculada  a probabilidade de a transação ser fraudulenta. Se a probabilidade for muito alta — e esta taxa é definida junto com a área de negócio —, se pode cancelar a compra e, se, ao contrário, for muito baixa, a compra é aprovada imediatamente. “Quando aprovo a compra imediatamente, estou melhorando a experiência para o cliente. Quando barramos as compras que são fraudes, trazemos o saving para a companhia, porque evitamos a fraude e aumentamos a possibilidade de o cliente usar a plataforma”, explicou.

Para tanto, a área de dados da Via conta com um data lake único e trabalha fazendo a combinação de mais de 50 variáveis para as avaliações de fraude. “Quando construímos um modelo, um algoritmo, usamos machine learning, que olha as mais de 50 informações de forma combinada. Antigamente, a análise de fraude era manual, tendo uma pessoa analisando as informações para poder dizer se a transação era ou não uma fraude”, detalhou. Apesar de toda a tecnologia empregada, a coordenadora ressaltou que sempre vai ter uma pessoa por trás.

“Não conseguimos que o ser humano faça todas as análises, mas, quando há dúvida (e porque temos recurso limitado), tem a parte de entrar em contato com o cliente para saber da compra. O humano entra na probabilidade média de fraude. Quando é tão alta, que é quase certeza que é fraude, a transação é reprovada; e, se é tão baixa, é aprovada. Já no estágio intermediário, têm algumas ações”, contou. 

Tecnologia 

Cirdêmia Feitosa apontou três vertentes de evolução da tecnologia que impulsionam uma maior adoção de ferramentas de inteligência artificial. Do lado do negócio, houve um entendimento das empresas e das pessoas com relação à importância do uso de IA. Somado a isso, a própria evolução dos modelos estatísticos caminhou e houve evolução na tecnologia com computadores sendo robustos e tendo capacidade de processamento suficiente para rodar modernos modelos de machine learning. A nuvem mudou esse cenário.

“Nos últimos 20 anos, tivemos modelos com acurácia melhor, mas demorava muito para processar estes modelos, porque não era nuvem. A grande evolução foi a nuvem, mas também foi o tempo de maturidade analítica das empresas, das áreas, de conhecerem os benefícios”, ponderou a coordenadora. Ao sair de um modelo processado localmente para usar a capacidade computacional da nuvem, machine learning deslanchou. Atrelado a isso houve a evolução da segurança. 

Contudo, nem todas as batalhas estão vencidas. Ainda é um desafio disseminar o conhecimento não apenas dentro das companhias, disse Feitosa. Ela aposta que a abertura do sistema financeiro, o open finance (ou open tudo, como a coordenadora colocou), vai dar mais combustível para abastecer os modelos de crédito. Uma vez que as empresas entendem melhor os dados dos clientes, podem ter uma melhor oferta de crédito ou a redução de juros, explicou a executiva.

“O maior desafio não está nas companhias, porque conseguimos acompanhar as evoluções, mas precisamos começar a pensar em como disseminar este conhecimento. Isso iria mudar o patamar de informação, porque a gente já fornece muitos dados”, disse, fazendo referência à adesão das pessoas ao open banking. Para ela, o próximo grande passo da IA não está em serviços financeiros, mas em oferecer um serviço melhor ao cliente. “Quanto mais dados tivermos, maior será a acurácia do modelo. Ter os dados e trabalhar eles para alimentar os modelos é uma curva que caminha dentro do esperado, mas como tornar isso uma experiência melhor para o meu cliente?”, questionou.

A resposta está, segundo a especialista, em melhorar o modelo para ter um olhar mais exclusivo, unitário. “A evolução é usar IA cada vez mais para experiência do usuário e combinar isso com crédito”, disse, ressaltando que o ponto é assertividade para encontrar a ‘próxima melhor oferta’ (expressão comumente usada em inglês: next best offer) para o cliente.

Trata-se de um marketing hiper direcionado. “Ressalto muito a combinação. Quando minha equipe desenvolve um modelo de crédito, penso em como fazer o cross nas áreas. Hoje, atuamos de forma cross e isso vai caminhando e se intensificando”, contou.

Na pandemia, Via desenvolveu um modelo com tabela cruzada para leading scoring para apontar a melhor próxima oferta e ajudar os vendedores. Com as regras de distanciamento em curso, outros meios de acessar os clientes foram impulsionados. Um deles foi o WhatsApp.  Com base no modelo desenvolvido, os vendedores sabiam para qual cliente valeria a pena fazer uma oferta por mensagem, quais teriam maior probabilidade de realizar a compra. “Isso é bem recente. Fizemos piloto e tivemos uma melhora na taxa de conversão. Não fizemos de forma massificada, mas na amostra tivemos cerca de 50% de aumento na taxa de conversão”, atestou.  

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