
O Ministério Público Federal abriu um procedimento administrativo para apurar se aplicativos de relacionamento destinados ao público LGBTQIA+ no Brasil adotam medidas eficazes de proteção aos usuários. A iniciativa ocorre após a divulgação de crimes cometidos a partir dessas plataformas em diferentes cidades do país, incluindo roubos, extorsões, agressões e até homicídios registrados no Distrito Federal, em Curitiba, Porto Alegre e São Paulo.
Responsável pela investigação, o procurador da República Lucas Costa Almeida Dias, que atua no Acre, considera que o uso de aplicativos para a prática de crimes já é uma questão de segurança pública consolidada, mas alerta que usuários LGBTQIA+ enfrentam vulnerabilidade adicional. “Além do perfil vulnerável das vítimas, o que torna os crimes especialmente alarmantes é a facilidade encontrada pelos criminosos nesses ambientes virtuais de repetirem as suas condutas impunemente”, afirmou no despacho.
O MPF identifica dois fatores centrais para a continuidade desses delitos. De um lado, o constrangimento e o medo das vítimas em denunciar, somados à exposição de dados pessoais. De outro, a ineficiência das próprias plataformas, que não implementam ferramentas robustas de segurança capazes de coibir a ação de criminosos.
O procedimento também discute a responsabilidade legal das empresas. Embora o Marco Civil da Internet limite a responsabilização das plataformas por conteúdos de terceiros, uma decisão do Supremo Tribunal Federal, em junho deste ano, estabeleceu o chamado “dever de cuidado”. Com isso, as plataformas passaram a ter obrigação de atuar preventivamente contra conteúdos que incitem discriminação por raça, sexualidade ou identidade de gênero, mesmo sem ordem judicial.
Levantamento do MPF mostra que aplicativos como Grindr e Hornet já preveem em seus termos de serviço específicos para o Brasil uma responsabilização maior das empresas. Ambos também assumiram compromissos públicos de aprimorar seus mecanismos de segurança, o que, segundo o órgão, pode favorecer soluções regulatórias mais rápidas e colaborativas. O documento cita ainda o exemplo australiano, onde um protocolo firmado com participação direta das empresas exige investimentos em sistemas de detecção de ameaças, canais de denúncia e bloqueio de contas irregulares.
Para instruir a apuração, o MPF enviou ofícios à Secretaria Nacional de Direitos LGBTQIA+, ao grupo de trabalho sobre discriminação digital do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, além dos próprios aplicativos Grindr e Hornet, que deverão prestar informações sobre as medidas já adotadas.
“O caso brasileiro demanda providências similares para garantir maior segurança à população usuária de aplicativos de relacionamento, sem comprometer a relevância que essas plataformas têm na comunicação e no senso de pertencimento das pessoas LGBTIQIA+”, concluiu o procurador Lucas Dias.
- Com informações do MPF