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Taxa de rede só beneficia Vivo, TIM e Claro

Brasil tem 20 mil provedores de internet e só três interessados na taxa de rede, diz Abrint

Por Roberta Prescott

A cobrança de uma taxa de rede sobre grandes provedores de conteúdo, Meta, Alphabet, Microsoft, Amazon, Apple e Netflix, tem como defensores apenas as grandes prestadoras de serviços de telecomunicações e não representa o desejo da maioria dos atuantes do setor. Essa foi a tônica do painel “O estado atual das taxas de rede no Brasil: perspectivas para 2025”, que reuniu Alessandro Molon, da Aliança pela Internet Aberta; Basílio Perez, da Abrint; Gustavo Santana Borges, da Anatel; Marcelo Bechara, da Abert; Sergio Garcia Alves, da ALAI, e o deputado David Soares no Abrint Global Congress – AGC 2025, nesta quinta-feira,8/5, em São Paulo.

Sem representante favorável à aplicação da taxa — também chamada de fair share ou network fee —, os painelistas sustentaram que não faz sentido cobrar pelo uso da infraestrutura e, em se fazendo, este custo seria repassado aos clientes finais. “No Brasil, quase tudo é fibra ótica e na fibra ótica você passar 50 megas, 100 megas ou 1 giga que não faz diferença. A taxa de rede é um problema falso; estão procurando solução para um problema inexistente. No Brasil, são mais de 20 mil provedores de internet e tem três interessados na taxa de rede”, defendeu Basílio Perez.

O executivo da Abrint lembrou que a primeira vez que ouviu sobre a taxa foi em 2012, mas a realidade era completamente diferente. “Naquela época, realmente, havia conteúdo longe, muitas vezes tinha de buscar nos Estados Unidos, estavam espalhados. Agora, no Brasil, tem muito conteúdo local com CDN e nos pontos de troca de tráfego. Tecnicamente o conteúdo foi para a borda da internet”, explicou Perez. Além disso, pontuou que a taxa quebra a neutralidade de rede e tira a possibilidade de inovação.  

Do lado da Anatel, Gustavo Borges explicou que a agência está finalizando uma proposta nas áreas técnicas com a superintendência de regulamentação e competição para encaminhar para o Conselho Diretor, que deve apreciar a proposta — podendo pedir modificações, complementos e estudo. “E a partir de uma apropriação pelo Conselho, deve haver uma unidade do Conselho para encaminhar para consulta pública. Existem os prazos da Agenda Regulatória. Todos os temas em debate na agência têm um prazo semestral de evolução. Então, esse semestre a gente tem que encaminhar a proposta para o Conselho Diretor. Até junho”, explicou Borges ao Convergência Digital.


Borges detalhou que a agência acompanha o debate internacional sobre a cobrança há algum tempo e entende que os provedores de conteúdo são grandes usuários, ocupando muito as redes. “São os grandes usuários e a agência avalia se existem ou não problemas entre estes grandes usuários e os operadores. Fizemos uma tomada de subsídios e um benchmarking internacional. Entendemos que o principal problema identificado é a complexidade de conversa entre os dois mercados: o de provedores de internet, de conexão, que são no Brasil mais de 20 mil, e do lado dos provedores de conteúdo”, disse durante o painel.

Como a dinâmica que acontece no mercado privado, um dos principais pontos avaliados pela Anatel é a possibilidade de se estabelecer uma mesa de conversa para os atores, por meio da instalação de um grupo governado pela Anatel no qual os representantes poderiam avaliar os problemas e discutir soluções conjuntas, buscando consenso. “Em princípio, não existe na proposta que a área técnica está fazendo a possibilidade de estabelecer uma taxa”, adiantou.

Além disso, há em debate no Congresso, o projeto de lei (PL) 469/2024, proposto pelo deputado David Soares (União/SP), quer proibir que os provedores de conexão de internet cobrem tarifas a provedores de aplicações de internet (como plataformas de streaming e redes sociais) com base no tráfego de dados que eles geram. O PL ainda está em fase de comissão. “A comparação que eu faço é como se uma rodovia, que é rentável, veja que ali se faz transporte de alto valor e o operador da rodovia quer cobrar adicional para quem está ganhando dinheiro usando a rodovia”, disse Soares no painel.

“A preocupação das grandes teles não é com a taxa de rede, mas com a competição, com a concorrência que faz o preço baixar. No fundo é uma taxa para matar a concorrência e queremos a livre iniciativa”, destacou Alessandro Molon, diretor-executivo da Aliança pela Internet Aberta, que apresentou novo estudo sobre o tema na quarta-feira (7/5), durante o Abrint Global Congress.

O documento responde à proposta apresentada, em 2024, pela Conexis sobre modelo de remuneração de prestadoras de serviços de telecomunicações por grandes usuários. Na ocasião, a entidade que congrega as grandes teles justificou que a cobrança é uma forma das big techs compensarem o lucro obtido pelos serviços que dependem da capacidade de rede. Para justificá-la, o documento contextualiza a formação do atual padrão de consumo de serviços digitais em meio ao conceito de neutralidade garantido em lei.  

A análise da Aliança pela Internet Aberta aponta que o racional econômico é falho e contrapõe o argumento da Conexis de que os prestadores de serviços de telecom, CSPs, não são suficientemente remunerados pelos investimentos em infraestrutura, enquanto os provedores de serviços de valor agregado se beneficiam gratuitamente das redes. “Assumir que os provedores de SVAs deveriam arcar com o custo do tráfego de rede desconsidera que eles já investem em infraestrutura, por exemplo, em redes de distribuição de conteúdo – CDNs e servidores dispersos, o que reduz tanto a necessidade de novos investimentos em rede quanto os custos de transmissão para ISPs e CSPs”, diz o texto.

Segundo o estudo, os pequenos provedores de internet. fundamentais para a expansão da banda larga em regiões com menor oferta de serviço no Brasil, não têm a ganhar com a propostas das grandes teles. “Diferentemente das operadoras nacionais, que concentram investimentos em centros urbanos lucrativos, os pequenos ISPs foram pioneiros na implantação de fibra óptica no interior do País, alcançando áreas remotas, periféricas e rurais. No entanto, esses provedores de menor porte não seriam beneficiados pela intervenção proposta. A maior parte da receita gerada pela taxa seria direcionada às operadoras nacionais, que já priorizam rentabilidade e dividendos aos acionistas em detrimento do reinvestimento em infraestrutura”, diz a AIA.  

A conclusão da entidade é que a taxa de rede proposta pela Conexis é baseada em argumentos econômicos falhos e que poderiam resultar em distorções graves no mercado. “Em vez de promover um crescimento equitativo e incentivar investimentos em infraestrutura, ela arrisca concentrar poder em poucos agentes, minando o avanço de serviços de Internet rápidos, baratos e de qualidade para os brasileiros, e aprofundando o fosso digital. Os formuladores de políticas deveriam, portanto, priorizar medidas regulatórias que estimulem a competição e a inovação, assegurando contínuos aportes na expansão da banda larga em todas as regiões do Brasil.”

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