TCU: custo operacional alto coloca Serpro e Dataprev em risco de colapso financeiro
Auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União no Serpro e na Dataprev, aprovada pelo plenário na última quarta-feira (21), aponta um quadro econômico e financeiro ruim para as empresas estatais. Relatório aprovado, de autoria do ministro Vital do Rêgo, mostra que as duas empresas estão elevando valores de contratos com clientes no governo federal, para suprir suas necessidade de caixa gerados com custos operacionais, entre eles, pagamento de salários, que consomem mais da metade das receitas das empresas.
O objetivo da Audotoria do TCU foi “avaliar a economicidade, eficiência, eficácia e legalidade dos serviços de tecnologia da informação prestados pela Dataprev e pelo Serpro, em especial, dos preços praticados nos contratos firmados por essas empresas com o Poder Público”.
Dataprev
Segundo o TCU, a atual situação econômico-financeira da empresa “é boa”. Nos últimos 10 anos, a Dataprev conseguiu aumentar seu lucro líquido em R$ 150 milhões, com uma média de 21% a.a (ao ano). Esse aumento líquido foi decorrente de receitas operacionais que geraram um incremento nas contas da empresa de 146%, vindos basicamente das receitas de serviços prestados ao INSS e às instituições financeiras (bancos), através do empréstimos consignados. O TCU também detectou que a melhora nas contas foi gerada em 2014, com o recebimento por faturas a atrasadas de clientes.
Na auditoria a própria empresa alegou que possui dificuldades para manter por longo tempo essa margem líquida de serviços prestados ao setor público, porque os preços praticados atualmente não chegam nem mesmo ao valor histórico atualizado pela inflação (IPCA).
Para o TCU, “essa dificuldade em manter os níveis de preços, seja por conta de estes serem elevados ou até mesmo por questões de restrições orçamentárias e fiscais da administração pública, pode levar a empresa a aumentar ainda mais a sua margem de lucro com o setor privado (consignados), onerando os empréstimos consignados que são realizados por aposentados e pensionistas do RGPS” (Regime Geral da Previdência Social).
Ou seja, na avaliação do tribunal, a Dataprev acabará se valendo de uma situação perversa: ter seus lucros mantidos ou elevados através do aumento no valor do pagamento pelos “serviços prestados” em empréstimos contraídos por aposentados e pensionistas.
O tribunal constatou que na questão salários, 55% de toda a receita operacional líquida gerada pela empresa é consumida com o pagamento de pessoal e encargos ( não levando em conta as despezas com terceirizados). Entre os anos 2007 e 2016, os custos e as despesas cresceram cerca de 108% e 296%. Se considerados em conjunto cresceriam 137%. ” A remuneração de pessoal foi o item que mais impactou os resultados da empresa, alcançando o valor de R$ 645 milhões em 2016 (R$ 194,36 milhões de despesas e 450,74 milhões de custos)”, destacou o TCU.
Como contraste ao aumento da lucratividade, a Dataprev nos últimos cinco anos acabou diminindo a rentabilidade dos seus negócios. De acordo com o TCU, a queda média nessa rentabilidade é de 12% a.a. (ao ano), o que fez com que a empresa tenha chegado em 2016 com uma rentabilidade de 11%. “Ou seja, para cada R$ 1,00 investido, a empresa conseguiu retornar R$ 0,11 centavos de lucro”.
Na situação financeira, a Dataprev tem enfrentado problemas de caixa por longos períodos. Segundo o TCU, isso é decorrente – no contraponto do bom desempenho na geração de receitas operacionais – pelo fato da empresa não conseguir manter o mesmo ritmo no recebimento das faturas de clientes prejudicando sua capacidade de investimento e pagamento. As informações foram obtidas pelo tribunal através dos relatórios aprresentados pelo Conselho Fiscal da empresa.
Essas informações mostram que 93% dos clientes da Dataprev chegaram a atrasar seus pagamentos, sendo que 84% dos atrasos eram devidos pelo INSS, seu maior cliente. “Com a análise do fluxo de caixa de investimento, foi possível constatar que o baixo desempenho nos investimentos da empresa está relacionado à dificuldade de geração de caixa operacional, o qual é afetado pelos longos períodos de acúmulo de faturas atrasadas”.
O TCU também constatou que, por causa desses atrasos de pagamentos de clientes, isso provocou uma retração na capacidade instalada no período 2015 e 2016. Sem dinheiro para investir direito na capacidade instalada, os recursos ficaram abaixo do necessário à reposição.
Serpro
O relatório do ministro Vital do Rêgo informa algo que todos já sabiam: a estatal de processamento de dados vem acumulando prejuízos, ou “dificuldades para gerar lucro”. Em 10 anos (2007 a 2016), teve prejuízo em quatro exercícios financeiros distintos (2010, 2011, 2014 e 2015). Isso levou a empresa a gerar um prejuízo acumulado da ordem de R$ 597,1 milhões.
O volume elevado de custos/despesas seria o principal motivo para o Serpro ter dificuldade de gerar lucro, o que, na avaliação do tribunal, os valores estão bem próximos das receitas líquidas obtidas. “O volume excessivo de custos/despesas acaba onerando os órgãos que contratam o Serpro, haja vista que em alguns casos os clientes não possuem opção, devido à especialização dos serviços que já se encontram internalizados na estatal ou porque somente são providos pela empresa, muitas vezes a preços mais elevados que os praticados pela iniciativa privada”, destaca o TCU.
Vital do Rêgo destacou como o Serpro vem obtendo receitas nos últimos 10 anos, com um incremento de 63% em 2016. O tripé para o crescimento das receitas da estatal se baseia em: 1- Serviços de processamento de dados (84%), 2 – Desenvolvimento de sistemas (8%), 3 – Suporte e Assistência de informática (6%). Porém, as receitas acabam consumidas pelos gastos que a empresa acaba arcando.
Segundo o TCU, os custos do Serpro são basicamente formados pelas despesas com pessoal (70%), depreciação e amortização (6%) e com manutenção (5%), um outro tripé nefasto que acaba prejudicando financeiramente a empresa. Nos últimos 10 anos, as despesas com pessoal cresceram cerca de 105%, sendo que somente nos últimos quatro anos o crescimento foi de aproximadamente 60%. Um salto de R$ 1 bilhão em 2013, para chegar a R$ 1,6 bilhão em 2016.
O tribunal destaca como outros “itens relevantes na estrutura da empresa” os custos/despesas com depreciação, amortização e manutenção. Houve um crescimento de cerca de 91% no período de dez anos,com depreciação e amortização, enquanto que os ativos, sobre os quais incidem (imobilizado e intangível), aumentaram apenas 28%.”Apesar de o crescimento da depreciação e da amortização ter sido maior do que os aumentos dos ativos, no acumulado, a empresa conseguiu manter a mesma capacidade instalada de 2007″, destaca o relatório do TCU.
Mas o tribunal entende que essa depreciação pode indicar a existência de maiores desgastes nos bens do ativo imobilizado, o que justificaria os aumentos dos custos/despesas com manutenção, os quais cresceram cerca de 63% nos últimos dez anos.
“No que concerne à rentabilidade, o índice caiu cerca de 193%, saindo de 0,06 em 2007 para – 0,05 em 2016. Os fracos desempenhos da rentabilidade da empresa estão também relacionados aos custos/despesas elevados”.
O TCU reconhece que o Serpro em seu aspecto financeiro tem passado por “dificuldades na obtenção de caixa, precisando, em alguns momentos, ser socorrida por aportes de capital realizados pela União”. Segundo o tribunal, Nos últimos oito anos foram realizados quatro aportes, somando o montante de R$ 714,6 milhões.
“Em 2009, se não fosse o aporte de R$ 271 milhões realizado em 2008, a empresa não teria condições de cobrir a variação negativa do seu caixa (R$ 80,5 milhões)”. Mesmo assim o TCU destaca que em 2011 – considerando o aporte realizado em 2008 – a empresa não conseguiria pagar suas despesas operacionais, sem que a União realizasse nova transferência de recursos à empresa, desta vez no valor de R$ 184 milhões.
Em 2014, a empresa foi obrigada a se socorrer novamente desses aportes para pagar suas despesas operacionais. Naquele exercício financeiro, a empresa “iniciou o ano com R$ 42,9 milhões em caixa, no entanto, no decorrer do exercício, as suas saídas de caixa operacional foram superiores às entradas em R$ 92,6 milhões, ou seja, o saldo inicial de caixa não conseguiria, por si só, cobrir o déficit do caixa operacional, como também ocorreu em 2011”.
O tribunal constatou que houve “significativa melhora de caixa” em 2015/2016, que pode ser explicada pela autorização legislativa para obtenção de uma meta de resultado primário negativo maior, principalmente no ano de 2016. Porém, a empresa foi proibida pelo tribunal de receber novos aportes do governo, sem que houvesse a reclassificação como “estatal dependente”. A empresa teria de apresentar um melhor desempenho no recebimento das faturas de clientes.
“No entanto, cabe ressaltar que as melhorias no caixa operacional não retiram o risco de descontinuidade das operações da empresa já que o caixa operacional gerado ainda é muito próximo ao volume de investimentos necessários à manutenção da capacidade instalada, bem como do volume de fornecedores a pagar”, alerta o TCU.
E o tribunal destacou a fama de “mau pagador” que o Serpro recebe do mercado privado de informática. Segunto o TCU, a capacidade de pagamento piorou consideravelmente nos últimos dez anos, inclusive com atrasos (44%) e renegociação (14%) de faturas devidas a fornecedores.
Acórdão do tribunal
O TCU através dos seus ministros aprovaram o relatório do ministro Vital do Rêgo e determinaram que o Serpro e a Dataprev reavaliem alguns dos serviços e que torne mais transparente aos clientes os seus modelos de negócio.
Determinou ao Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão que oriente os órgãos da administração federal que fazem contratos com o Sepro e a Dataprev, para no prazo de 90 dias, passem a exigir junto com a proposta comercial, os demonstrativos de formação de preços de cada serviço e sistema objeto da proposta. “Em nível de detalhamento que permita a identificação dos recursos produtivos utilizados (insumos), com as respectivas quantidades e custos”, informou o tribunal.
Em outras palavras, o TCU quer tentar estancar a sangria nas empresas, causada pelos excessivos gastos operacionais, que estão sendo financiados através de contratos mais onerosos, sem a justificativa clara na formação de preços de serviços que as duas estatais prestam para a Administração Federal.