A Oi merece um fim honroso ou um horror sem fim?
Mesmo agonizante, a Oi ainda se insere nos dias atuais no funcionamento sistêmico das telecomunicações no Brasil, mesmo que em escala bem menor.

Por Juarez Quadros do Nascimento*
Um fim honroso refere-se a um término que traz honra, dignidade ou respeito a uma pessoa, causa ou situação e implica que o fim ocorra de maneira decente ou com a devida consideração. Já um fim horroroso refere-se a um término que causa horror, pavor ou repulsa e é um desfecho trágico, chocante ou deplorável. Qual desses fins merecem os usuários de serviços da Oi, ou a Oi – a pretensa supertele nacional – , cuja situação parece agonizar?
Ante uma dívida de R$ 65 bilhões, em 20/06/2016 a Oi apresentou pedido de recuperação judicial, que foi deferido pelo Juiz da 7ª Vara Empresarial da Comarca da Capital do Rio de Janeiro. Naquela ocasião, a Oi detinha 34% do mercado de telefonia fixa, 18% do mercado de telefonia móvel e em 2.748 municípios operava cerca de 70% dos acessos à internet; o que mostrava sua dimensão no Brasil. Contudo, mesmo agonizante, a Oi ainda se insere nos dias atuais, em escala bem menor do que foi até os anos 2010, no funcionamento sistêmico das telecomunicações no Brasil.
Importa lembrar que na Assembleia Geral de Credores, em dezembro de 2017, marcada pelo apoio da maioria dos credores ao Plano de Recuperação Judicial da Oi, a Anatel (conforme decisão unânime e sem medo dos membros do seu Conselho Diretor) foi a voz dissonante, ao votar contra a sua aprovação. A Anatel, em seu papel de credora e reguladora, poderia ter decretado a falência da Oi, mas, ante implicações de interesse público, preferiu exercer o papel de guardiã da coisa pública. Mesmo contestando o tratamento dado aos créditos públicos, a Anatel não fez juízo de valor quanto às partes do Plano que tratavam dos créditos privados.
No curso do Processo, foi aprovada por seus credores estruturar alguns de seus ativos como Unidades Produtivas Isoladas, em preparação para processos de alienação. Dos ativos vendidos, a Oi Móvel resultou em um aporte de R$ 14,47 bilhões ao caixa da empresa, dos quais R$ 4,64 bilhões foram pagos ao BNDES. A venda das torres rendeu R$ 1,05 bilhão e a dos Data Centers trouxe R$ 325 milhões para a Companhia. O controle da “V.tal” foi vendido por R$ 12,92 bilhões, com a Oi a permanecer como acionista relevante da empresa. Havia ativos com venda a concluir: o de TV por assinatura, que tinha um lance de R$ 786 milhões e o das torres de telefonia fixa, com proposta de R$ 1,7 bilhão, que dependiam de aprovação.
Com uma redução de 54,99%, a dívida passou de R$ 20,237 bilhões para R$ 9,109 bilhões, a abranger tanto o saldo dos débitos não tributários originais quanto os novos desde 2020. Descontando o montante dos depósitos judiciais da Oi, apropriados pela Anatel, o valor líquido ficou em R$ 7,335 bilhões. Os créditos públicos foram equacionados em 2022. Da dívida de R$ 65 bilhões em 2016, a Oi quitou pagamentos com 35.372 credores, dentre os quais a renegociação com a Anatel e o pagamento integral da dívida com o BNDES. Aos fornecedores, a Oi pagou R$ 2,4 bilhões. Dos cerca de 65 mil credores, pouco menos de 59 mil tinham a receber até R$ 50 mil.
Com a homologação da Justiça o litígio deu-se por encerrado, sem a Anatel ser obrigada a fazer com que a União assumisse o ônus de uma delicada intervenção na operadora, a lançar mão do ferramental legal e regulatório disponível para a solução de litígios dessa complexidade. Entretanto, no início de 2023 a Oi pediu nova tutela antecipada na Justiça e sinalizou uma segunda recuperação judicial, cujo pedido ocorreu em 06/02/2024.
A versão do plano da segunda recuperação judicial da Oi foi de cerca de R$ 45 bilhões. Desta vez, a negociação está voltada principalmente para os bondholders, detentores de títulos de agências de crédito e bancos nacionais, além de fornecedores de contratos “Take or Pay”. Porém, depois de idas e vindas, em 30/09/2025, a Juíza da 7ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, com toda razão, decretou a antecipação da liquidação parcial da Oi, com a suspensão do pagamento dos débitos da empresa, destituição da diretoria e a respectiva transição da prestação de serviços essenciais por meio de interventores.
Segundo a magistrada, pesaram na decisão para a antecipação da liquidação parcial o “laudado esvaziamento patrimonial” da Oi, o fornecimento de informações “equivocadas” à Justiça, a contratação de profissionais com custos “elevadíssimos” e a não apresentação de plano de transição para os serviços públicos. Além disso, a Juíza também destacou “constatação inafastável” de que a Oi afirmava possuir débito extraconcursal que estimava R$1,5 bilhão, além dos valores que já faziam parte da recuperação judicial.
Além da discussão travada nos autos principais da segunda recuperação judicial; no que se refere ao descumprimento das obrigações previstas no plano de recuperação e encontram-se suspensas por força de decisão cautelar da Juíza; também consta a inadimplência para com o cumprimento de obrigações extraconcursais. A Oi buscava na Justiça a suspensão da exigibilidade dessas obrigações extraconcursais pelo prazo inicial de 60 dias.
Na sua decisão a Juíza da 7ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro fixou que em 30 dias (até o fim de outubro passado) seria avaliada a liquidação integral da empresa. Tal prazo foi curto e precisou ser ampliado. Nessa demanda, ante implicações de interesse público, o prazo de 30 dias, 60 dias ou 90 dias é extremamente desafiador para que seja encontrada uma solução. É necessária uma equação de continuidade operacional provisória, como prevista no inciso XI do artigo 99 da Lei nº 11.101/2005, no sentido de se determinar a continuação provisória das atividades do Grupo Oi.
A possibilidade de aquisição de contratos do que ainda sobra na Oi – a Oi Soluções, que opera no segmento corporativo e de atendimento a governos – é um tipo de negócio desafiador e se houver necessidade de avaliar ativos ou carteiras de clientes, o timing da liquidação da Oi decidido pela Justiça não é necessariamente o mesmo que se aplica à negociação a envolver a Oi Soluções.
É preocupante a manutenção dos serviços de tridígito para emergências e serviços públicos, como: 135 (Previdência), 136 (SUS), 146 (Receita Federal), 190 (Policia Militar), 191 (Polícia Rodoviária Federal), 192 (SAMU), 193 (Corpo de Bombeiros), 197 (Polícia Civil), 198 (Polícia Rodoviária Estadual), 199 (Defesa Civil) e outros tridígitos. Além disso, a Oi ainda opera serviços de interconexão com 258 operadoras e adicionalmente é responsável pelo atendimento de cerca de 7.000 localidades onde somente os orelhões (telefone públicos) permitem telefonia fixa como recurso essencial de comunicação.
De suma importância e zelando pela segurança aeronáutica o contrato da Oi com o Cindacta (Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo) está sendo transferido para a Claro. A transferência do contrato do Cindacta, por determinação da Justiça, somado ao cenário de incertezas com o futuro da Oi, é modelo suficiente e necessário para a gestão dos demais negócios da empresa. Pois a Oi Soluções ainda tem contratos com bancos, redes de loterias e outros clientes que, mesmo não sendo caracterizados como serviços essenciais ou emergenciais, são serviços de interesse público.
A Anatel até poderia executar garantias de R$ 450 milhões atreladas ao acordo para migração da concessão de telefonia fixa da Oi, caso seja necessário custear novas empresas que venham a assumir serviços essenciais hoje prestados pela Oi. Contudo, uma solução para a migração dos serviços da Oi dificilmente seria alcançada no prazo que a Justiça avalia decretar a falência da Oi.
Em fato relevante divulgado na noite de 7/11/2025, a Oi peticionou o pedido da decretação da falência. No fato relevante, o Gestor Judicial deixa claro que por decisão tomada pela Juíza no dia 30/10/2025, de manter o arresto dos recursos até a decisão final sobre a possível falência, que peticionou a possível caracterização do estado de insolvência do grupo Oi, seja pela impossibilidade de suportar o pagamento de todo o passivo extraconcursal, seja pelo descumprimento do plano de recuperação judicial em vigor, e pela incapacidade do Grupo Oi em promover medidas de maximização do seu fluxo de caixa.
O fato relevante diz ainda que ‘em se entendendo pela liquidação judicial das recuperandas, o Gestor Judicial submeteu à apreciação do Juízo da Recuperação Judicial a previsão no sentido de determinar a continuação provisória das atividades do Grupo Oi até que se ultime a transferência integral de todos os serviços atualmente sob a responsabilidade das Recuperanda, autorizando que se mantenha em operação toda a estrutura física e de pessoal suficiente para garantir a plena execução de todos os serviços até sua efetiva transição”.
É a derrocada financeira da Oi, que, oficialmente, assume não ter mais dinheiro para pagar salários e demais atividades. Com o dia 10/11/2025 marcado pela Justiça como o dia “D” do grupo Oi, para dar o sinal verde quanto a continuidade do plano de recuperação da empresa ou a decretação de sua falência, não a situação da Oi, mas os provedores e usuários de serviços que ainda restam na Oi merecem consideração para uma solução honrosa aos seus problemas.
(*) O autor é Engenheiro Eletricista, Evangelista Regulatório e Tecnológico. Foi ministro de Estado das Comunicações e presidente da Anatel.



