Guerra por tributação sobre bens digitais
Da forma como foi posta é inevitável que haja conflito entre Estados e Municípios na busca pela tributação dos bens digitais, pois à luz das regras mencionadas acima, o mesmo fato, disponibilização de músicas ou filmes, pela internet, por exemplo, pode dar ensejo à cobrança do ISS ou ICMS, dependendo exclusivamente da interpretação da autoridade fiscal respectiva, o que expõe contribuintes a uma iminente dupla tributação.
Este panorama é terrível para os negócios, pois a imprecisão e insegurança jurídica favorece companhias mal-intencionadas e fomenta a sonegação de impostos. De outro lado, penaliza severamente as empresas que procuram agir em conformidade com a lei, pois não se tem o mínimo de previsão ou planejamento, tornando tarefa impossível estabelecer quais serão os custos tributários envolvidos na atividade respectiva, o que no mundo atual é impensável.
É claro que todas as transações de bens e serviços são passiveis em tese de tributação, entretanto, também não é menos certo, que existam regras claras que proporcionem o mínimo de segurança jurídica e legalidade aos contribuintes, até para que seja homenageado o princípio da neutralidade tributaria de modo a não gerar desequilíbrios concorrenciais, sobre as atividades econômicas.
É preciso destacar que as empresas de tecnologia, principais afetadas pelas alterações mencionadas neste artigo, faturaram ao longo de 2017 algo em torno de 155 bilhões de dólares, segundo dados da Forbes. O que torna ainda mais premente a necessidade de se buscar soluções efetivas para tais companhias continuem a gerar empregos e renda no Brasil.
O tema não é fácil, a solução ou ao menos a mitigação para tamanha desordem passa necessariamente por uma reforma tributária que altere drasticamente o sistema tributário, quem sabe unificando ISS e ICMS no IVA (Imposto sobre valor agregado), com definições claras sobre repartição das receitas, definidas na Constituição entre Estados e Municípios. Todavia, inúmeras propostas neste sentido têm sido travadas ou simplesmente não evoluem, pois, esta alteração pressupõe perda de poder (competência tributária), do qual prefeitos e governadores em geral não querem abrir mão.
Outras propostas surgem no campo acadêmico como a elaboração de uma lei complementar nacional que regulamente para todos entes (Estados e Municípios), as regras e limites que devem ser observados na tributação dos bens digitais, ou mesmo a criação de uma plataforma ou sistema de arrecadação nacional, que padronizasse ao menos os recolhimentos a título de ICMS e ISS, sem alteração direta na competência, com isso os contribuintes teriam maior segurança jurídica e gastariam menos tempo no cumprimento de obrigações acessórias, outro ponto negativo do nosso sistema tributário.
Entretanto, enquanto, mudanças não são aprovadas, novamente, restará aos contribuintes prejudicados ou afetados pela bitributação, a procura pelo Poder Judiciário, o qual também não possui uniformidade de entendimento sobre a matéria, e sujeita os jurisdicionados a uma verdadeira loteria. Sem falar nos altos custos envolvidos com processos e toda incerteza sobre um desfecho favorável.
*Átila Melo Silva é advogado especialista em Direito Tributário e sócio do Manna, Melo & Szperman Advogados Associados