O papel das PPPs na atualização tecnológica da Internet brasileira
A Internet comercial está completando 30 anos no país. Sem as PPPs, ela não aconteceria.

Por Fabio Vianna Coelho (*)
Muito já foi escrito e falado sobre a importância dos ISPs na disseminação do acesso à Internet no país. No início desta década, esses provedores se multiplicaram em áreas que, por serem menos povoadas e desenvolvidas economicamente que grandes centros, não geravam interesse comercial das teles. Explorando esses mercados, PPPs foram as responsáveis pelo número de acessos fixos saltar de 36,3 milhões no final de 2021 para 52 milhões em dezembro do ano passado.
A relevância socioeconômica deste feito é de difícil mensuração, mas ele trouxe outros desdobramentos. Conforme recente estudo da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), a Internet brasileira figura entre as mais avançadas do mundo no que se refere à tecnologia utilizada em redes. Com 75,6% de suas conexões viabilizadas por fibra óptica, o Brasil fica atrás apenas de Islândia, Coreia do Sul, Espanha e Lituânia entre os que integram a organização e muito acima da média geral entre seus participantes (44,6%).
O balanço semestral da entidade atribuiu este resultado a esforços realizados por grandes operadoras e provedores regionais. Ocorre que, conforme dados da Anatel, em outubro, os últimos detinham 27,6 milhões de acessos viabilizados por fibra, 66% do total (41,3 milhões naquele mês).
ISPs detêm a maior parte desta rede não por serem visionários ou apostarem em tecnologias de ponta. A razão principal é o período em que eles se proliferaram, mais de dez anos após a fibra óptica ser incorporada ao mercado de SCM. Como ocorre com qualquer solução tecnológica, seu preço caiu com o passar do tempo. Por isso, era acessível aos provedores regionais que nasciam a partir de 2020.
Situação muito diferente viviam as grandes teles. Controladas por multinacionais que lhes garantem poderio econômico, tinham de direcionar grandes quantias para o cumprimento de obrigações adquiridas no leilão do Sistema Telebras – como a universalização do acesso à telefonia fixa. Houve esforço para que suas redes fossem atualizadas, porém, mais que à atualização, a maior parte dos aportes foi direcionada, inicialmente, à ampliação de suas redes.
A adoção da fibra óptica por grandes operadoras tem se acelerado. Desde 2024, Vivo e Claro dedicam-se intensamente à substituição de suas redes de cobre e cabos coaxiais por fibra óptica. Dessa forma, encerraram o último ano com 7,3 milhões e 1,86 milhão de acessos fixos viabilizados pela tecnologia.
Ainda que registrem avanços relevantes, as duas teles seguem muito atrás dos ISPs no que se refere à tecnologia empregada em redes. E mesmo que detenham, em conjunto, uma infraestrutura maior, PPPs têm investido em fibra nos últimos anos. Dessa vez, na ampliação.
O relatório Setorial de Desempenho das PPPs, divulgado pela Anatel em fevereiro, registra que 64% dos investimentos em bens de capital no segmento de SCM realizados entre o primeiro semestre de 2023 e igual período do ano passado partiram de provedores regionais. O estudo não menciona o destino preferencial desses aportes, mas, com base nos dados acima, essas empresas, certamente, têm ampliado suas redes.
A Internet comercial está completando 30 anos no país. Seu início deu-se em abril de 1995, quando a Embratel disponibilizou o acesso à web – antes restrito no país a instituições acadêmicas – a usuários comuns. Naquele momento, as conexões eram ainda discadas.
Hoje, principalmente, por conta dos ISPs, o país desfruta de um dos melhores índices do mundo no que se refere a conexões via fibra óptica. Portanto, é preciso valorizar o papel dessas empresas, que têm sido, recorrentemente, alvo de ataques, algumas vezes, justificáveis; noutras, não.
ISPs são acusados recorrentemente pelo emaranhado dos cabeamentos aéreos. Muitas dessas empresas, de fato, atuam à revelia das concessionárias e instalam suas redes sem observar padrões técnicos e de segurança. Porém, se fossem os principais responsáveis por este quadro, ele não seria observado em grandes centros, onde são as teles as principais fornecedoras de serviços de telecomunicações.
Também, durante a revisão do Plano Geral de Metas de Competição, grandes operadoras esmeram-se em atacar a assimetria regulatória, fator que possibilitou a multiplicação dos PPPs e, consecutivamente, a expansão do acesso à Internet no país. Por sorte, o regulador manteve a existência de regras mais flexíveis para os provedores regionais.
Há um número significativo de ISPs que atuam de forma irregular ou à margem da regulamentação, o que ocorre em qualquer segmento da economia. Exemplo disso é que o Relatório Setorial da Anatel tem por base dados de apenas 7,3 mil empresas que lhes remetem a coleta de Dados Econômico-financeiros e Técnico-operacionais – uma obrigação de todo prestador de SCM –, quando se sabe que, ao todo, elas são mais de 20 mil. Mas, quando se comemora o início da operação da Internet aberta no país e se observa seus avanços, é preciso reconhecer e valorizar a importância das PPPs.
(*) Fabio Vianna Coelho é sócio da VianaTel, consultoria especializada na regularização de ISPs, e do RadiusNet, software de gestão para provedores de Internet.