Telecom

Relator diz que AT&T não precisa seguir lei brasileira por ter sede nos EUA

Em singular genuflexo à pressão externa, a Anatel acelerou a decisão sobre os efeitos no Brasil da compra da Time Warner pela AT&T, negócio de mais de US$ 85 bilhões anunciado ainda em 2017. O principal nó é que o novo grupo reúne programadoras de conteúdo da Warner com a operadora Sky, da AT&T. Mas em contraste com a análise técnica e jurídica sobre o assunto, o relator do caso na agência, Vicente Aquino, endossou a tese das interessadas de que a lei de TV por assinatura brasileira não faz restrições a quem não tem sede no país. 

Em longo arrazoado de três horas na tarde desta quinta, 22/8, Aquino votou no sentido de acolher a interpretação de que o artigo 5º da Lei do Seac, que veda o controle cruzado entre operadoras com produtoras e programadoras, concentra explicitamente tal restrição a empresas “com sede no Brasil”. 

“Cinco vezes no mesmo artigo se repete a expressão ‘com sede no Brasil’. Se a gente quiser interpretar alguma coisa fora da sede do Brasil, não consigo fazê-lo. Não há necessidade de recorrer-se à hermenêutica para se chegar a uma conclusão sobre a matéria e uso as palavras da procuradora da Sky, é uma questão de grande simplicidade”, afirmou Aquino. 

Ou seja, na tese defendida pela Sky, e agora com pelo menos um voto no conselho diretor da Anatel, ao estabelecer vedações de controle somente a empresas “com sede no Brasil”, a Lei que rege o mercado de TV paga no país não teria efeitos sobre empresas sem sede por aqui. Ou ainda, que a AT&T não precisa respeitar as vedações da Lei brasileira porque não tem sede no Brasil. 

É o contrário do que até aqui era o entendimento prevalecente na própria Anatel. Ao instruir o processo, a área técnica, assim como a Procuradoria Federal Especializada (a AGU na Anatel) entenderam que a programação de conteúdo do exterior para o Brasil seria permitido às programadoras estrangeiras desde que sujeitas às leis e ao foro brasileiro quanto aos atos ou operações com efeitos no Brasil. Na prática, seria preciso uma empresa brasileira para prestar o serviço de acordo com lei do Seac. 


Curiosamente, a Anatel já se manifestou favorável a que a Lei do Seac seja alterada justamente no ponto questionado. Em agenda de projetos de lei que envolvem telecomunicações, a agência levou ao Senado Federal, neste ano, a defesa de alteração no artigo 5º da Lei 12.485/11. “Tal vedação hoje cria condições de tratamento não isonômico entre as empresas e obstaculiza o surgimento de novos modelos de negócio e a inovação no setor, em prejuízo aos consumidores dos serviços”.

Como a proposta já ganhou um projeto de lei (3832/19), a espera da AT&T pela decisão brasileira, última pendente sobre o acordo no mundo, parecia atrelada à mudança na lei, que encerraria a polêmica sobre o negócio. No entanto, tudo indica que a visita do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) à Anatel na segunda, 19/8, fez a agência acelerar a pauta.

A visita do deputado, filho do presidente da República e candidato a embaixador nos EUA, foi divulgada por ele mesmo como uma defesa do tema. “Estive hoje na Anatel com o presidente Leonardo Euler e o conselheiro Vicente Aquino. Argumentei pelo fim da proibição de quem produz conteúdo não poder distribuí-lo. Vedação sem sentido prevista na lei Seac/2011”, tuitou. Ato contínuo, a agência marcou uma reunião extraordinária para tratar do assunto três dias depois da visita.

O voto do relator Vicente Aquino foi o primeiro no Conselho Diretor. Ele foi imediatamente acompanhado pelo conselheiro Aníbal Diniz. Mas o placar de 2 a 0 parou por aí. Houve pedido de vista pelo conselheiro Moisés Moreira. “Hoje tivemos 62 itens na pauta da reunião, inclusive o TAC da TIM, e não consigo de forma açodada apreciar esse voto, um tanto quanto extenso”, justificou.

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