Telecom

Satélites: mercado nacional aquecido e Starlink é vista como ‘um elefante na sala’

A presença da Starlink, do bilionário Elon Musk, no mercado brasileiro colocou o setor no foco do mercado, mas causa estranheza, tanto que a empresa foi tratada como ‘um elefante na sala’ e não teve, em nenhum momento, seu nome citado pelas participantes durante painel realizado na Futurecom 2024.  

O presidente do SindSat, Fabio Alencar, reforçou que é preciso tomar cuidado com a atenção dedicada a apenas uma empresa. “Estamos vendo outras empresas chegando e várias soluções disponíveis no mercado”, lembra. Falando pelo conjunto das operadoras, Alencar diz que o Brasil deve ver em breve novas ofertas, como constelações dedicadas.

O diretor geral da Star One Embratel, Lincoln de Oliveira, concorda e lembra que a oferta de orbita baixa não é a única do mercado. Ao contrário, o executivo diz que a empresa tem usado as ofertas de novos entrantes para complementar seu próprio portfólio. “A chegada de novas constelações é disruptiva e estamos absorvendo essa arquitetura, nos defrontando com novas soluções e novas oportunidades”, diz.

Quem também tem apostado no trabalho conjunto com outras empresas é a Eutelsat. “Trabalhamos em conjunto e somos parte desse ecossistema que leva digitalização ao mercado”, explica Juan Pablo Cofino, vice-presidente regional e diretor de vendas Américas da companhia. Para ele, o mercado brasileiro representa uma oportunidade massiva, por seu tamanho e quantidade de verticais.

Quem também concorda com o aquecimento do mercado é o presidente da Abrasat, Mauro Wainberg. A entidade tem hoje cerca de 30 associados entre operadoras, fabricantes e prestadores de serviços, consequência do atual momento. “Tudo isso levou a uma evolução muito grande. Esse é o catalisador de tudo o que estamos vendo hoje”, diz.


O papel do governo

Apesar do crescimento da demanda e da participação privada no setor, fica claro que o governo – até bem pouco tempo o único operador existente no mercado – continua tendo um papel importante. Para Wajnberg, essa importância se dá pelo tamanho do País, pela definição de políticas públicas e por iniciativas de inclusão baseadas em satélites.

Oliveira, da Star One, lembra que a tecnologia de satélites é indispensável para governos de países continentais como o Brasil, porque sempre haverá regiões remotas precisando de cobertura. “O que esperamos é que o mercado tenha condições iguais que alguns itens da política de impostos sejam repensados para fomentar o setor”, diz, citando como exemplo a criação de tarifas diferenciadas para as redes terrestres de gateways necessárias à operação dos satélites.

“O investimento aqui pode ser tão alto quando no próprio satélite, por isso muitas empresas estão colocando seus gateways fora do Brasil. Uma tarifa mais justa fomentaria a economia e traria ganho na escala”, defende.

Alencar, do SindSat, defende a criação de um ambiente amistoso para a tração de empresas. Ele lembra que o setor paga, sobre os gateways, impostos 80% mais altos do que qualquer país da América Latina. “Há várias frentes em que o governo precisa pensar”, diz.

Cofino, da Eutelsat, lembra que em outros mercados existem incentivos e formas criativas de lidar com impostos e que, neste locais, a companhia utiliza estas isenções para realizar mais projetos, criando um círculo virtuoso. “Em alguns países da América Latina e nos estados Unidos, os governos têm um papel mais flexível”, compara.

Latência não é um problema

Outro ponto debatido foi a visão que se tem de que as soluções baseadas em satélites são caras, têm latência e não oferecem o desempenho esperado. Oliveira, da Star One, fez questão de lembrar que a latência nem sempre é um problema e que o mercado dá a ela uma dimensão maior do que realmente tem.

“Sobre o preço, ele tem caído com a entrada de novas constelações e hoje dizer que o satélite é caro é relativo quando se fala em uma região remota”, provoca, lembrando que o setor precisa buscar equilíbrio para atender a demanda e conseguir reinvestir. Wajnberg lembrou ainda que o preço deve ser avaliado de acordo com a aplicação.

“Hoje o satélite é o meio mais barato de se fazer broadcast no Brasil. É certo que todos os operadores tentam melhorar seus preços e ganhar escala, mas isso precisa ser feito pensando na recuperação do investimento feito em um ativo que tem vida limitada”, diz, lembrando que o ganho de escala tem sido buscado com novas constelações, multiplicando a capacidade disponível e reduzindo o preço de forma saudável.

Cofino, da Eutelsat, concorda que preço e latência dependem da aplicação e que os clientes devem levar em conta outras características que tornem a solução atraente. Além disso, ele lembrou que fabricar uma constelação demanda bilhões de dólares em investimentos que devem ser recuperados. “Precisamos entender as demandas das verticais para monetizar os investimentos”, afirma.

D2D ainda distante

Uma tendência que vem ganhando corpo em outros mercados é o chamado casamento das tecnologias de satélite e celular, ou o D2D (Direct to Device).  Oliveira, da Star One, acredita que o D2D pode ser uma tendência complementar, permitindo aos usuários usarem a rede celular onde houver cobertura e os satélites em regiões remotas. Mas ele crê que ainda há pontos de atenção. Um exemplo é a banda a ser utilizada. “Ou serão frequências especificas ou o operador de satélite usará o espectro da operadora móvel”, diz.

Para ele, usar a banda da operadora móvel é a chave para ter volume, o que torna o negócio atrativo em termos de preço. Ao mesmo tempo, o uso de bandas específicas é mais limitado e talvez não consiga atingir milhões de assinantes.

Wajnberg, da Abrasat, vê na união das tecnologias um novo horizonte de soluções, principalmente quando se fala na conexão com a internet das coisas, com forte impacto em aplicações como áreas como logística e agronegócio, por exemplo. “Tem um potencial enorme. Vejo esse tipo de constelação que fala com celular sendo usada para iniciar serviço celular em locais que não tem infraestrutura, mas, se a tecnologia evoluir, quem sabe podemos ver competição com as operadoras”, afirma.

A competição também é um final possível para Alencar, do SindSat, para quem a parceria pode funcionar até o momento em que as operadoras celulares avançarem com suas redes de fibra. “É difícil um satélite ter o mesmo preço de um serviço terrestre. Virou hype porque há apoio das operadoras celulares, mas se elas evoluem em cobertura, podem abandonar essa alternativa”, acredita.

Cofino, da Eutelsat, também não demonstra entusiasmo. Ele acredita que ainda há muito a ser definido em termos de regulação e também em relação ao modelo a ser adotado. “É um modelo que vai impactar grandes grupos e grandes investimentos das operadoras de telecom. Não sei como vai acontecer. Se acontecer, será complementar. Há um empurrão em alguns países, não acho que vai substituir a infraestrutura terrestre”, diz.

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