PGR defende validade de negociação que reduz direitos trabalhistas
Em parecer ao Supremo Tribunal Federal, o procurador-geral da República, Augusto Aras, sustentou como válidos os acordos coletivos de trabalho que reduzem direitos não previstos de forma expressa na Constituição Federal. No entendimento do PGR, apenas direitos absolutamente indisponíveis, como os relativos à saúde, higiene e segurança do trabalhador, não podem ser mitigados.
O parecer foi encaminhado ao ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) nº 1.121.633, em que se discute a validade de um acordo trabalhista celebrado antes da entrada em vigor da Lei 13.467/2017, conhecida como reforma trabalhista.
O acordo aboliu o pagamento do tempo em que empregado se desloca de casa até o trabalho e o seu retorno, nos casos em que a empresa se situa em local de difícil acesso ou não servido por transporte público regular. Até o advento da reforma trabalhista, os regramentos previam que as horas in itinere fossem computadas como jornada de trabalho e, consequentemente, remuneradas pelo empregador.
No Supremo, a matéria teve repercussão geral reconhecida (Tema 1046) com o seguinte enunciado: “A validade de norma coletiva de trabalho que limita ou restringe direito trabalhista não assegurado constitucionalmente”. Em casos de repercussão geral, o entendimento firmado a partir do julgamento pelo colegiado passa a ser seguido por todas as cortes do país.
Antes de fazer a análise do mérito sobre tema, Augusto Aras suscita questão de ordem a respeito de dois pontos: o alcance temporal do julgamento que, segundo ele, deve abranger apenas o período anterior à vigência à Reforma Trabalhista; e a delimitação da questão jurídica do tema de repercussão geral, a partir do qual será formado um precedente vinculante. Nesse sentido, o PGR propõe alteração do enunciado do Tema 1046 para: “Validade de cláusula de norma coletiva de trabalho que reduz ou suprime o direito dos trabalhadores ao cômputo das ‘horas in itinere’ na jornada de trabalho, em período anterior à vigência da Lei 13.467/2017”.
Ao defender a posição, o PGR enfatiza que a legitimidade das entidades sindicais é extraída da própria Constituição. E, ao contrário da alegada ocorrência de uma suposta renúncia a direitos, o ato da categoria profissional tem apoio dos trabalhadores responsáveis pela eleição dos dirigentes sindicais que entabularam a negociação.
O procurador-geral refuta ainda o argumento segundo o qual acordos coletivos que restringem as horas in itinere atingiriam direitos sociais trabalhistas de caráter indisponível, similares ao controle de jornada constitucionalmente previsto no inciso XIII do art. 7º da Constituição. Para ele, não é possível equiparar horas de percurso e horas de efetivo trabalho por serem incomparáveis, tanto sob o aspecto da fadiga decorrente do labor realizado, quanto da subordinação.
Ao concluir o parecer, Augusto Aras opina pelo provimento do recurso extraordinário interposto pela empresa Mineração Serra Grande S.A., com sugestão de fixação de duas teses jurídicas. A primeira, restrita ao tema das horas in itinere. “Prestigiada a autonomia privada negocial coletiva, é válida cláusula de norma coletiva de trabalho que reduz ou suprime o direito dos trabalhadores ao cômputo das ‘horas in itinere’ na jornada de trabalho, em período anterior à vigência da Lei 13.467/2017”.
Caso os ministros considerem a possibilidade de se conferir ampla abstração e generalidade à tese de repercussão geral, o PGR sugere a seguinte redação: “À exceção dos direitos trabalhistas absolutamente indisponíveis assegurados por normas constitucionais, tais como as normas relativas à saúde, higiene e segurança no trabalho (art. 7º, XXII/CF), as convenções e os acordos coletivos de trabalho podem admitir redução ou supressão de direitos, conforme o princípio da autonomia privada negocial coletiva (art. 7º, VI, XIII, XIV e XXVI).”
* Com informações do MPF