Legislativo e Judiciário garantem LGPD, enquanto governo empurra com a barriga
Mais do que uma vitória Legislativa para a proteção de dados no Brasil, a votação do Senado Federal pela vigência da LGPD em agosto deste 2020 é um recado político claro: enquanto o governo federal se contorce para postergar a validade da Lei Geral de Proteção de Dados, as instituições ecoam apelos da sociedade e do mercado digital pela necessidade urgente da Lei.
“Foi uma votação estratégica. O grande ponto que precisamos considerar não é propriamente um cálculo normativo de qual o prazo vem antes, qual vem depois, se é da MP 959, se é do PL 1.179/20. Não é uma disputa normativa comum, mas um movimento no qual o governo federal quer ostensivamente que a LGPD não entre em vigor. À despeito de discussões sobre a MP caducar, o que interessa é a leitura política. A sociedade, as instituições, o Legislativo e o próprio Judiciário já se posicionam que a solução para um sistema minimamente moderno de proteção de dados no Brasil é que a Lei entre em vigor em agosto, que é o que vai acontecer”, destaca o advogado e professor Danilo Doneda.
O especialista reforça um ponto que chegou a ser colocado durante a votação no Senado do destaque que acabou consolidando a vigência da LGPD para agosto deste ano: o risco de um adiamento para 2021 abrir caminho para novos adiamentos por meio de Medida Provisória.
“Qualquer adiamento que permitisse o prazo da vigência ir para 2021 faria com que o governo federal pudesse, o ano que vem, na próxima Legislatura, editar uma nova Medida Provisória, postergando novamente a entrada em vigor da LGPD, empurrando com a barriga mais uma vez. Já verificamos, reiteradamente, que o governo federal não tem qualquer comprometimento com a entrada em vigor da Lei. Pelo contrário, está fazendo todo o possível e o impossível para que a vontade clara do legislador, da sociedade, não seja colocada em operação.”
A evidência mais concreta da falta de interesse do Poder Executivo em avançar nesse tema é a inexistência da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, o braço operacional da LGPD, a quem cabe regulamentar, acompanhar e fiscalizar a implementação.
“Além de usar MP para adiar, o governo não coloca de pé a ANPD e o Conselho, que são garantias para que a sociedade e o mercado tenha segurança na implementação da LGPD. O governo está tão atrasado que não se tem a menor ideia do projeto para a Autoridade Nacional. E nem se fala em relação aos nomes, mas de estrutura mesmo. Não tem nada”, diz Doneda.
Daí a importância do posicionamento adotado pelo Legislativo e pelo Judiciário. “O processo só vai para frente se for capitaneado e cobrado pelos outros Poderes. E o Legislativo deixou claro que a LGPD precisa entrar em vigor agora. Até porque se isso não acontecer já neste ano, vai ficando cada vez mais complexa a situação. Tem várias iniciativas de uso de dados, para fins estatísticos, para telemedicina, para responsabilidade na internet. Tudo isso precisa ser acoplada ao sistema de proteção de dados. Senão cada nova lei vai tratar do assunto de um jeito. E o custo que as empresas já sentem vai ficar ainda mais acentuado se a LGPD não entrar em vigor. Porque essa questão já é realidade. O STF deixou claro, por 10 a 1, que a Constituição protege os dados pessoais. E o Senado deixou claro por 62 a 15 que a LGPD tem que entrar em vigor em agosto.”