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Marco legal de inteligência artificial trata como exceção uso que será regra

A Comissão Temporária Interna sobre Inteligência Artificial no Brasil (CTIA), instalada no Senado Federal para analisar o projeto de lei 2338/23, terminou nesta quinta, 26/10, um ciclo de 7 audiências públicas para discutir um marco legal de IA no país. 

Como se viu durante vários debates, a própria necessidade de regulação específica não é exatamente um consenso. Diferentes debatedores apontaram que princípios constitucionais e leis específicas, como o Código de Defesa do Consumidor e a Lei Geral de Proteção de Dados, servem para avaliar o impacto e eventual dano com o uso de ferramentas de inteligência artificial. 

Há, no entanto, preocupações com os riscos decorrentes de decisões automatizadas e com o viés algoritmo – ou seja, como as fórmulas usadas no desenvolvimento e aprendizagem de IA reproduzem preconceitos verificados na sociedade. 

Mas como destacou o professor, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade/Rio e consultor da Abranet, Carlos Affonso de Souza, há uma questão que merece ser avaliada com carinho pelos parlamentares que é anterior mesmo aos problemas potenciais: o próprio tratamento do que será regulado pela lei precisa ser melhor calibrado. 

“Inteligência artificial não é um setor. Inteligência artificial é um tema transversal. Um tema que vai impactar as entidades e as empresas de logística, de manutenção, de produção de conteúdo, de varejo. Dizer que uma empresa é de inteligência artificial em pouco tempo não vai fazer sentido. Toda empresa vai ser empresa de inteligência artificial”, disse o especialista na reunião desta quinta, 26/10. 


Como lembrou, “em curto espaço de tempo, assim como hoje é estranho uma empresa que não esteja na internet, uma empresa que não aplique de maneira importante para suas atividades determinadas soluções de inteligência artificial será objeto de enorme espanto. Então, de certa forma, estamos falando em um futuro no qual inteligência artificial não será exceção. Inteligência artificial será a regra. E justamente por isso essa visão precisa estar plasmada em todas as atividades e iniciativas do poder público e que instruem o próprio pensar da regulação como um todo.”

De forma semelhante, avaliou Souza, ao tratar da “pessoa afetada” por inteligência artificial, o projeto de lei resvala em uma  questão: excetuar algo que cada vez mais é corriqueiro. 

“Fazendo esse olhar de inteligência artificial como regra e não exceção, chama atenção logo na largada os personagens do projeto de lei. O primeiro trata da pessoa afetada por sistemas de inteligência artificial. Temos aqui, na própria maneira como o PL se refere a esse protagonista, algo que mereceria um olhar cuidadoso. Pessoa afetada por inteligência artificial parece, de novo, algo excepcional. Como se essas pessoas seriam a exceção. E sabemos que todos seremos de alguma forma afetados por inteligência artificial diversas vezes no nosso dia a dia. IA será rotina, não será excepcional.”

Finalmente, o consultor da Abranet defendeu maior coordenação sobre o tema da IA, naturalmente transversal. 

“É necessário haver uma maior coordenação sobre as diferentes atividades envolvendo IA nos diferentes poderes. Temos o debate no legislativo, temos no Executivo a Estratégia Brasileira de Inteligência artificial – e ANPD com consulta de sandbox – e o Judiciário em manifestação recente do presidente do STF, Luis Barroso, sobre a necessidade de o Judiciário contar com ferramentas que podem tornar o dia a dia do magistrado e da magistrada mais eficiente. Precisamos de uma coordenação para que o Brasil tenha uma visão que lhe seja própria de IA e que possa explorar a identidade do país nesse sentido.”

Veja a transmissão da audiência pública – Comissão sobre Inteligência Artificial debate regulação da nova tecnologia -, realizada no Senado Federal em 26/10/2023

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