
O Tribunal de Contas da União apontou uma série de fragilidades na governança e execução das políticas públicas de inclusão digital do governo federal. Segundo o Acórdão 1699/25, aprovado nesta quarta, 30/7, as iniciativas existentes não atendem aos parâmetros de “conectividade universal e significativa”.
Segundo o relatório de auditoria que embasou a decisão, há um “inaceitável atraso” na criação do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), previsto no Decreto 11.542 de 2023, que deveria produzir subsídios para a elaboração de um Plano Nacional de Inclusão Digital (PNID). A Corte de Contas entende que os membros só foram nomeados, quase dois anos após a publicação do decreto, por conta da auditoria. O grupo foi formalizado pelo Mcom em portaria de 24/7.
Um dos principais achados da auditoria é a falta de um plano estratégico nacional e a atuação “fragmentada” e “dispersa” do Estado no combate à exclusão digital. O TCU constatou que as ações governamentais não estão devidamente estruturadas, formalizadas ou institucionalizadas.
Além disso, o TCU apontou que os mecanismos de engajamento da sociedade na formulação e implementação das políticas são ineficientes, o que impede o governo de elaborar soluções que atendam de fato às necessidades da população. Também reclama que a falta de centralização e clareza na divulgação dos dados sobre os programas dificulta o acesso da população, que precisa navegar por múltiplas páginas para obter informações.
Diz, ainda, que os programas existentes são considerados insuficientes para fomentar a conectividade universal e significativa, concentrando-se em aspectos como infraestrutura, mas deixando lacunas em outras dimensões essenciais como acessibilidade financeira e habilidades digitais. O relatório destaca que apenas 22% dos lares brasileiros desfrutam de uma conectividade considerada significativa, apesar de 84% terem acesso à internet.
Como resultado, o TCU emitiu determinações e recomendações. O Ministério das Comunicações foi cobrado a, em um prazo de 30 dias após a instalação do GTI, criar e instalar as câmaras setoriais de oferta e demanda. O MCom também terá 180 dias, a partir dessa mesma data, para publicar e enviar ao TCU o relatório final do grupo com os subsídios para o Plano Nacional de Inclusão Digital.
O Tribunal também recomendou ao governo que adote medidas para fortalecer os mecanismos de participação social, centralize as informações sobre os programas e considere todas as dimensões da inclusão digital, incluindo a qualidade da conexão, acessibilidade e habilidades dos usuários, ao formular novas políticas.
As deliberações são as seguintes:
1) determinar ao Ministério das Comunicações que:
a. em 30 dias, a contar da reunião de instalação do Grupo de Trabalho Interministerial, institua e instale efetivamente as câmaras setoriais de oferta e de demanda, a fim de assegurar o cumprimento do disposto no art. 5º, § 1º, e nos arts. 6º e 7º da Portaria MCom 19.125/2025 e possibilitar a concretização da medida “Edição de um Plano Nacional de Inclusão Digital”, estabelecida na Lei 14.802/2024;
b. em 180 dias, a contar da reunião de instalação do Grupo de Trabalho Interministerial, publique e encaminhe a este Tribunal de Contas da União cópia do relatório final do grupo, com os subsídios para elaboração do Plano Nacional de Inclusão Digital, conforme previsto no art. 11, parágrafo único do Decreto 11.542/2023;
c. em 180 dias após a publicação do relatório final do Grupo de Trabalho Interministerial, elabore o Plano Nacional de Inclusão Digital, conforme previsto no art. 1º, caput, do Decreto 11.542/2023, no art. 2º, caput, do Decreto 12.282/2024 e na medida “Edição de um Plano Nacional de Inclusão Digital”, estabelecida na Lei 14.802/2024;
2) recomendar ao Ministério das Comunicações que:
a. em articulação com a Casa Civil da Presidência da República, implemente estrutura de coordenação permanente das políticas de inclusão digital, com a definição de papéis e responsabilidades dos diversos atores envolvidos e, se necessário, com a criação de comitês ou câmaras setoriais para assegurar a abordagem integral do tema;
b. institucionalize mecanismos de participação social ativa no âmbito do Plano Nacional de Inclusão Digital e das políticas públicas relacionadas, por meio de consultas, audiências públicas e outros instrumentos que assegurem a escuta às demandas da sociedade;
c. estabeleça, em normativo, a obrigatoriedade de publicação de relatório periódico de acompanhamento e avaliação de programas e ações de inclusão digital do governo federal, e divulgue, em portal de fácil acesso, informações unificadas sobre o tema, incluindo orçamento, metas, público-alvo, regiões atendidas e resultados alcançados;
d. adote estratégias diversificadas de divulgação de programas e ações de inclusão digital, utilizando meios como rádio, televisão e pontos de atendimento presencial, de modo a garantir que a população excluída digitalmente tenha acesso às informações e à participação em tais ações;
e. na formulação e revisão das políticas públicas sobre o tema, considere de forma integrada todas as dimensões da inclusão digital e da conectividade universal e significativa, quais sejam: infraestrutura, acessibilidade financeira, acesso a equipamentos, qualidade de conexão, habilidades digitais (incluindo o letramento em inteligência artificial) e conteúdo adequado;
f. avalie a oportunidade e conveniência de instituir programa direcionado aos grupos mais vulneráveis, como idosos, beneficiários de programas sociais e pessoas de baixa escolaridade, para oferta de cursos presenciais de letramento digital e em inteligência artificial, ministrados por meio de convênios ou parcerias;
g. avalie a viabilidade de incluir, em futuros editais para outorga de faixas de frequência, em acréscimo às metas de cobertura, novas metas de conectividade universal e significativa, vinculadas a compromissos de oferta de planos de serviço acessíveis (tarifas sociais) e de apoio a projetos de letramento digital por parte das operadoras, especialmente em regiões carentes;
3) autorizar a realização de Seminário Internacional sobre Inclusão Digital e Letramento em Inteligência Artificial, com o objetivo de aprofundar o debate sobre o tema e fomentar a construção de soluções conjuntas entre os setores público e privado, a academia e a sociedade civil;
4) dar ciência da deliberação, acompanhada do Relatório e do Voto que a fundamentam à Casa Civil da Presidência da República, ao Ministério das Comunicações, ao Comitê Gestor da Internet no Brasil, às Comissões de Fiscalização Financeira e Controle e de Comunicação da Câmara dos Deputados, às Comissões de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática e de Comunicação e Direito Digital do Senado Federal, e à Coordenadoria de Telecomunicações do Instituto de Defesa do Consumidor;
5) determinar à Secretaria-Geral de Controle Externo, por meio da Unidade de Auditoria Especializada em Comunicações, que monitore o cumprimento das deliberações deste Acórdão.