TCU: Governo e TSE perdem dinheiro com duas versões de carteira de identidade
Corte de Contas recomenda o fim da ICN, emitida pela Justiça Eleitoral
Ao apresentar a 8ª edição do Relatório de Fiscalizações em Políticas Públicas, o Tribunal de Contas da União destacou entre os achados que o desalinhamento entre projetos tocados pelo Tribunal Superior Eleitoral e pelo governo federal resultaram em duplicidade – e consequente desperdício de recursos – pela existência concomitante de dois programas de carteira nacional de identidade.
“Não se pode tratar a convivência entre os programas ICN [Identidade Civil Nacional] e CIN [Carteira de Identidade Nacional] como um risco de possível ineficiência decorrente do convívio entre as iniciativas, mas como a materialização da duplicação de esforços em iniciativas semelhantes, em ofensa ao princípio da eficiência e em detrimento do interesse público do cidadão brasileiro em contar com processo de identificação civil nacional, seguro, integrado e eficiente”, diz o TCU.
Como lembra a análise da Corte de Contas, as tentativas de criação de um documento nacional único de identificação civil remontam a 1997, com o Registro de Identidade Civil (RIC). Vinte anos de vai e volta, o RIC foi substituído, em 2017, pela Identificação Civil Nacional (ICN), a partir de um projeto apresentado pelo Tribunal Superior Eleitoral.
“Mais uma vez, falhamos como Estado na implementação de uma política integrada para identificação de nossos cidadãos”, anotou o relator do caso no TCU, ministro Vital do Rêgo. “A unificação do processo de identificação civil no Brasil é desafio de longa data e que tem enfrentado barreiras de toda ordem, atrasando o desenvolvimento de soluções digitais e acarretando ineficiência por meio da proliferação de bases de informação e iniciativas similares.”
Com o naufrágio do RIC, por dificuldades de orçamento e governança, o Tribunal Superior Eleitoral, que já começara a capturar as impressões digitais dos eleitores em formato eletrônico, apresentou ao governo federal a proposta de uma nova identidade, a mencionada ICN. O TSE começou a produzir um documento em versão somente digital, quando em 2022, o governo decidiu criar um novo projeto.
Assim, pelo Decreto 10.977/2022, foi criada a Carteira de Identidade Nacional (CIN). A partir de 2023, a CIN ganhou proeminência nas políticas relacionadas a governo digital, tanto que passou a ser um dos pilares da digitalização de serviços públicos. A CIN vem ganhando tração e já é emitida em 26 unidades da federação – só falta Roraima aderir.
“Em essência, esses dois projetos apresentam duplicação de objetivos. Ainda que haja diferenças na forma e no conteúdo de cada identidade, que favorecerá uma ou outra a depender do uso, ambos os documentos cumprem o mesmo propósito para o uso precípuo de identificação do cidadão”, conclui o TCU.
Com a apuração da Corte de Contas, iniciada ainda no ano passado, o TSE, que aguardava resposta do governo para a adoção do ICN como a versão digital da CIN, acabou decidindo suspender o projeto. Mas ele não foi totalmente encerrado e conta com orçamento da Justiça Eleitoral. Daí que o TCU sugere aos envolvidos em ambos os projetos que se entendam.
“Embora os efeitos dessa duplicação de esforços e iniciativas já tenham se materializado, a extensão dos seus efeitos ainda está em aberto, de forma que, ainda que tardiamente, possam ser adotadas medidas visando à maior racionalidade na condução do processo de identificação única no país com o objetivo de conferir maior eficiência na alocação de recursos públicos, bem como para propiciar que os cidadãos e a sociedade como um todo possam colher os benefícios que o país tanto almeja com as respectivas iniciativas”, conclui o TCU.
Para o Tribunal, a alternativa que mais atenderia ao interesse público para esse caso seria a suspensão definitiva do projeto de implementação pelo TSE, seguida de edição de normativo regulamentar pelo Comitê Gestor da ICN dispondo que a criação do desse documento, prevista na Lei 13.444/2017, está atendida pela CIN, evitando dispêndio de recursos financeiros e eventual equívoco por parte dos usuários.