Inovação

Serviços digitais mudam uso e processos de compras de TI no governo

Até o fim deste ano, o governo federal pretende disponibilizar os primeiros quatro serviços digitais a partir do que será a porta unificada de atendimento aos cidadãos em suas diversas relações com a administração pública. Tema de interesse óbvio em qualquer sociedade conectada, sua materialização foi especialmente determinada a partir do Decreto 8.936, editado em dezembro de 2016, que não apenas fixa prazos, mas exige uma nova forma de relacionamento do Estado com os brasileiros.

A norma prevê a faculdade de “solicitação e o acompanhamento dos serviços públicos sem a necessidade de atendimento presencial”, a ordem para os órgãos “implementar e difundir o uso dos serviços públicos digitais” e que seja possível “disponibilizar, em plataforma única e centralizada, mediante o nível de autenticação requerido, o acesso às informações e a prestação direta dos serviços públicos”.

Trata-se de um exemplo claro de decisão política com impactos diretos no uso da tecnologia. Além de saber quais são e para que servem os serviços prestados pelo governo federal, a ordem presidencial exige suporte de ferramentas de TICs, bases interoperáveis e acesso ubíquo via internet. Associada a comandos anteriores sobre acesso à informação e compartilhamento de dados na administração, ela dá a base para o uso de tecnologias da informação e comunicações (TICs) pelo Estado.

O Ministério do Planejamento, que tem entre suas funções coordenar o uso de TICs no governo federal, começou um censo dos serviços pelos ministérios e órgãos da administração direta, depois estendido a autarquias e fundações, universidades públicas e institutos federais. O levantamento é feito pela Escola Nacional de Administração Pública por meio de questionários que buscam, além de identificar os serviços, dados sobre custos de atendimento, perfil dos usuários, tamanho do público-alvo e tempo médio de espera.

“O numero de serviços é enorme. Ainda estamos catalogando. Chegamos em 600 serviços até aqui, mas estimamos que vamos identificar mais de 2 mil serviços públicos em nível federal. Nem todos serão digitais. O censo busca mapear aqueles potencialmente digitalizáveis”, explica o diretor do Departamento de Governo Digital do Ministério Planejamento, parte da secretaria de TICs, Wagner Araújo.


O canto tecnológico é música em tempos de dificuldades econômicas. Na pasta que também cuida do Orçamento da União, o mantra é de que os serviços digitais reduzem em até 97% os custos para o governo. Além de eliminar da vida do cidadão os deslocamentos desnecessários, o tempo de espera nas filas, a impressão de certidões e a autenticação de documentos.

Sustentado em estudos realizados no Canadá, no Reino Unido, na Noruega e na Austrália, o Planejamento calcula que o atendimento presencial custa em média US$ 14. No entanto, quando o mesmo serviço é prestado de forma online, esse valor cai para US$ 0,39.

Em outra frente, o Tribunal de Contas da União estima, com base em dados de 2016, que poucas ferramentas digitais já permitiriam ao Executivo economizar mais de R$ 1 bilhão por ano.  De acordo com esses dados, “apenas nos exemplos de marcação de consulta em hospitais e de matrícula em escolas públicas, o impacto para a sociedade pode chegar a R$ 486 milhões por ano, levando em conta as horas de trabalho desperdiçadas pelos cidadãos em filas de atendimento. Da mesma forma, os estudos apontaram uma potencial redução no custo operacional para o Estado em R$ 562 milhões por ano caso o atendimento fosse realizado de forma eletrônica”.

O mesmo levantamento apontou que, em relação à “possibilidade de o cidadão conseguir finalizar o serviço sem a necessidade de acessar ou utilizar-se de outros meios, como fazer cadastros, consultas ou emissão de certidões em outros sítios eletrônicos, que pode ser denominado de serviço autossuficiente, somente 24,89% dos órgãos atendem integralmente a este requisito, ao passo que 35,37% disseram que alguns de seus serviços o atendem”.

Se sobram incentivos pelo lado fiscal, outra premissa adotada na digitalização do atendimento é de que o celular é um aliado especial na garantia de acesso amplo. Em 2014, quando os planos de agora nem eram sonhados, 76% dos cidadãos que usavam a internet se conectavam pelo celular. Esse percentual pulou para 89% em 2015 e chegou a 93%, em 2016, como apontam as sucessivas pesquisas realizadas pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (TIC Domicílios).

“O brasileiro tem consumido cada vez mais internet por dispositivos móveis. Entretanto, o uso de aplicativos móveis ora está em voga, ora não, especialmente porque ocupa espaço na memória dos aparelhos. Por isso, preferimos investir nos sites responsivos. Descobrimos que é mais interessante para o proprietário do celular. Ou seja, para quem entra no portal, em servicos.gov.br, é completamente responsivo em dispositivos móveis”, afirma o diretor de Governo Digital.

Conselho de Desenvolvimento Econômico apressa lançamento de serviços digitalizados

Além de enxergar que o celular é o meio prioritário nos acessos à internet e a necessidade de simplificar a busca em bases de dados, houve uma certa pressão do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social _ colegiado de aconselhamento à Presidência da República que reúne nomes importantes da sociedade civil e, especialmente, do empresariado nacional _ para apressar a digitalização de serviços.

A meta inicial do governo com o Decreto 8.936/2016 era concluir, até o fim de 2018, a digitalização de pelo menos nove serviços: emissão de CPF; emissão de passaporte; cadastro único; passe livre interestadual para pessoas carentes e com deficiência; financiamento estudantil (Fies); prova de vida de aposentados e pensionistas; requerimento de seguro-desemprego; recurso de multas do DNIT e o cadastro de fornecedores.

O resultado dessa provocação foi a decisão de antecipar quatro sistemas: emissão de passaporte com a dispensa da apresentação de documentos como quitação eleitoral e militar; a emissão do passe livre para pobres e deficientes; o alistamento militar online e o cadastramento de empresas no rol de fornecedores a órgãos públicos. “Nesses quatro casos haverá, ainda em 2017, um nível maior de automação do que o atual”, completa Oliveira.

“Estamos mapeando os serviços de maior relevância, de maior impacto, para fazer a automação. Buscamos ainda antecipar o lançamento de alguns. Essa estratégia foi provocada pelo ‘Conselhão’ e nos pediram para antecipar alguns resultados para desburocratizar. Mesmo que não seja da forma mais elegante, vamos antecipar alguns desses efeitos”, afirma o secretário adjunto de Tecnologia da Informação e Comunicações do Ministério do Planejamento, Angelino Oliveira.

A escolha dos quatro primeiros está diretamente relacionada ao grau de sua preparação. Paralelamente, o Ministério do Planejamento adquiriu, em um contrato que pode chegar a R$ 14,5 milhões em quatro anos com a Lecom Tecnologia, uma “solução tecnológica para automação de serviços públicos, no modelo de software como serviço, bem como a adequação e automação dos serviços propriamente ditos”. Trata-se de uma aplicação, rodando em nuvem, para digitalizar serviços que hoje são total ou parcialmente analógicos.

“Não centralizamos tudo. Há ainda lançamentos de alguns serviços digitais por partes dos ministérios de forma isolada. Ao mesmo tempo estamos disponibilizando uma ferramenta, que é um facilitador. Porém, o uso é facultativo aos órgãos. Tanto que o contrato dessa ferramenta de automação foi pensado de modo muito escalável, inclusive porque só será pago qualquer valor para aquele serviço público que for digitalizado e estiver em execução”, explica Wagner Araújo.

Nesse primeiro momento, ainda em 2017, a escolha por um dos quatro serviços antecipados vai encaminhar o usuário para sistemas de atendimento próprios de suas áreas afins. Mas, em seguida, virão os aprimoramentos, especialmente nos aspectos de identificação e certificação de quem está utilizando os serviços.

“A solução serve para automatizar serviços públicos em parte ou no todo. Porém, vale lembrar que já existem serviços públicos digitalizados na Receita Federal, e no alistamento militar, desenvolvido pelo Ministério da Defesa. São soluções que continuarão existindo, com esse mesmo processo de autenticação. Hoje há autenticações próprias, mas a ideia é que, em algum momento, haja um processo em que o cidadão seja identificado uma única vez para todos os serviços”, explica o diretor do departamento de governo digital.

No momento, a ferramenta de autenticação que está no portal de serviços do governo é do Serpro. “A Dataprev tem uma solução. O Serpro tem outra solução. A meta é que as duas soluções sejam combinadas entre si, em um barramento de autenticação”, revela Araújo.

O objetivo é usar um sistema com diferentes níveis de autenticação a depender do tipo de serviço desejado ou do perfil do próprio usuário. “Com o cadastramento, há selos de níveis de autenticação. Se tem cadastro de CPF na Receita é um selo, ou se é servidor público, por exemplo. O usuário ganha selo à medida que vai fornecendo informações para o governo. Em algum momento até a biometria vai conceder um selo de identificação na solução”.

A ferramenta de automação está disponível e deve ser usada por órgãos públicos que desejarem digitalizar as etapas de seus serviços, associada a uma solução de armazenamento em nuvem e uma ferramenta de autenticação. Sobre essa ferramenta, espera-se erguer uma arquitetura de federação de autenticações capaz de identificar os cidadãos em todas as suas relações com o Estado – de preferência por meio de dispositivos móveis.

“O governo é diverso. Os órgãos públicos que já têm TI e serviços consolidados não precisam mexer em sua estratégia, apenas aderir à plataforma para autenticação e a lista de serviços. Ao órgão que não tem maturidade para oferecer, o Ministério do Planejamento disponibiliza uma ferramenta que facilita a automação dos serviços públicos”, detalha Araújo.

Segundo o diretor do Departamento de Governo Digital do Ministério Planejamento, ainda em 2017, será possível ter os primeiros serviços interativos. “O módulo de automação de serviços públicos digitais permite isso. Já temos ofertas, mas ainda distribuídas. O portal de serviços deve ser o repositório único de serviços digitais, como se fosse um cardápio de restaurante, com todos os serviços que o governo federal oferece. O cidadão quer enxergar o governo como um só”, completa.

Botão Voltar ao topo