Balanço do Serpro mostra que estatal convive com o fantasma da insolvência
O balanço de 2016 do Serpro traz números significativos que refletem positivamente no prejuízo. Entretanto, nas entrelinhas das contas da estatal estão escondidas algumas “bombas relógio”, que mais cedo ou mais tarde explodirão, seja nesta ou em outra administração. E o tamanho deste rombo é tão grande que, hoje, dificilmente se poderá pensar em uma operação de socorro do Tesouro Nacional, que vem fechando as portas para outras estatais em apuros financeiros, como no caso dos Correios.
No campo das boas notícias, o balanço do ano passado mostra que houve uma redução significativa na inadimplência de clientes (órgãos federais), que contrataram serviços mas depois não pagaram. Em 2015 esse passivo era de R$ 396,4 milhões e caiu no ano passado para R$ 134,7 milhões. Entretanto, essa boa notícia não chegou para os fornecedores do Serpro. O balanço de 2016 mostra que a estatal continuou sem pagar as empresas particulares e a dívida até cresceu. Em 2015 a inadiplência do Serpro com fornecedores foi de R$ 304,9 milhões e em 2016 a dívida chegou a R$ 307,9 milhões.
Bombas relógio
Mas não são as dívidas com fornecedores ou a inadimplência dos clientes federais a quem prestou serviços que podem golpear de morte o Serpro. O problema está descrito no balanço e ele vem sendo empurrado com a barriga há anos. De um lado são as dívidas trabalhistas que já começam a entrar em fase de execução, após terem transitado em julgado com resultados desfavoráveis para a estatal.
Do outro são impostos e contribuições não recolhidos e eles estão descritos nos balanços sem que haja um alerta claro e público da situação e dos seus efeitos futuros pela direção da empresa. Aliás, por nenhum diretor que tenha passado pela estatal.
Nas “Provisões Trabalhistas e Cíveis, o “ressarcimento de pessoal”, que nada mais é do que pagamento de dívidas trabalhistas, saltou de R$ 439,8 milhões em 2015 para a estratosférica quantia de R$ 1,7 bilhão em 2016. Esse salto foi provocado pela decisão judicial em favor dos trabalhadores cedidos para a Receita Federal (PSE), que embora sejam lotados no Serpro, nunca pisaram na empresa. Foram contratados a partir de 1989 pela janela, direto para trabalhar no fisco e acabaram ganhando vínculo empregatício, com direito a receber diferenças salariais.
Nas notas explicativas do balanço do Serpro foi feita a discriminação desse passivo trabalhista:
1 – apropriação por competência de férias e licença prêmio (R$ 37,3 milhões)
2- valores históricos de desembolsos com sentenças judiciais do quadro de PSE (R$ 149,7 milhões), que foram efetuados ao longo do tempo, e serão objeto de ressarcimento após trânsito em julgado dos processos;
3 – expectativa de recebimento das provisões trabalhistas relativas a PSE (R$ 1,4 bilhão). Embora a União, por orientação da AGU, não possa reconhecer contabilmente a responsabilidade sobre essas provisões antes do trânsito em julgado dos processos, a expectativa de recebimento figura no balanço do Serpro.
O problema é que essa provisão de R$ 1,4 bilhão para ressarcimento de trabalhadores (PSE) não passa, até o momento, de uma mera expectativa que é colocada no balanço pelo Serpro, sem que haja algum dinheiro em caixa para cobrir esse rombo. Esse valor, inclusive é descrito como sendo de R$ 1,6 bilhão. Além disso, a maneira como é disposto no balanço soa como manobra contábil, porque figura no “Ativo Não Circulante” e acaba cobrindo o rombo nas contas da estatal.
Diante do que se tem visto no governo, acenando publicamente que não irá salvar os Correios, que estão em apuros financeiros, trabalhar com uma expectativa de que a União irá repassar quase R$ 2 bilhões (valores que ainda devem ser corrigidos na ação trabalhista) é puro exercício de otimismo. E já existe uma expectativa de que a Justiça do Trabalho de São Paulo irá expedir a execução do pagamento ainda este ano, pois todos os recursos impetrados pelo Serpro já foram negados.
Outra bomba relógio descrita no balanço de 2016 é a briga judicial envolvendo o Serpro e a Secretaria de Fazenda do Distrito Federal, que diz respeito a débito tributário da estatal de ICMS, no valor de R$ 250,3 milhões ( sem correção). “O Serpro ajuizou ação civil ordinária nº 2658/DF junto ao STF, que emitiu decisão favorável de tutela antecipada, concedendo a suspensão de exigibilidade do crédito tributário, objeto do Auto de Infração nº 10.275/2010. O valor não foi reconhecido no passivo pelo fato deste processo não ser classificado como de provável execução”, alega a empresa.
Mesmo caso vem ocorrendo com relação à Anatel, pois com base numa liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o Serpro vem deixando há anos de recolher aos cofres da União o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), por prestar Serviço de Comunicação Multimídia (SCM), através da Infovia Brasília. O caso chegou a ser denunciado em 2010 pelo portal Convergência Digital. Em setembro de 2013, a Anatel aplicou uma multa de R$ 1 milhão contra o Serpro, pelos valores atrasados de contribuição ao fundo, desde a implantação da Infovia. De lá para cá, por força de liminar, o Serpro permanece inadimplente com a Anatel e sequer leva isso em conta nos seus balanços.