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Telebras: Conselho de Administração aprovou diretriz sem saber que era fraude

Desde agosto de 2012 a direção da Telebras convive com informações que apontam para uma fraude documental que foi decisiva para a empresa não reajustar os valores da gratificação temporária concedida aos trabalhadores que atuaram no Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), seguindo os Acordos Coletivos de Trabalho. Na edição do dia 16 de maio o portal Convergência Digital denunciou a existência dessa fraude (Leia Aqui). Novos documentos em poder deste veículo comprovam que a direção sabia da fraude, mas nada foi feito até agora para apurar o caso.

Os indícios também mostram que pode ter partido da assessoria jurídica da Telebras a ideia de abafar o assunto, mesmo sabendo da existência de um crime. O documento falsificado contendo, inclusive, reprodução da assinatura do ex-presidente Rogério Santanna acabou sendo aprovada pelo Conselho de Administração. Santanna já garantiu a este portal que nunca assinou tal documento.

Para conferir ares de legalidade a um ato administrativo fraudulento, a Gerência Jurídica emitiu um parecer recomendando a aprovação pelo Conselho de Administração da Telebras. O documento falsificado passou por cima de outra decisão deste colegiado, que aprovou o reajuste da gratificação para funcionários que trabalharam na montagem e execução do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL).

Procurada para falar sobre o assunto e informar o que foi feito de lá para cá, ou a partir das denúncias de fraude feitas por este portal a empresa, por meio de sua assessoria jurídica, se limitou à seguinte frase: “A Telebras, a seu tempo e forma, dentro das normas legais que o caso requer, toma as providências cabíveis, em todas as esferas correspondentes à natureza do tema sob análise.”

Primeiro sinal de fraude


No dia 3 de agosto de 2012 o então diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com Investidores da Telebras, Fabrício Santos Limoeiro, encaminou o Memorando 118/2012/2500 à Gerência Jurídica, pedindo orientações sobre como agir, com base nas informações que recebera de uma Nota Técnica 18/2012, elaborada pelo então Gerente de Recursos Humanos, Vinício Rossetto.

Fabrício aparentemente considerava estranha a Nota Técnica de Rossetto, pois ao mencionar o documento, ele solicitava orientação quanto “as consequências jurídicas” que haveria, se seguisse o que determinava o “RH” da empresa. Fabrício pode ter sido o primeiro representante da direção a manifestar temor por repercussões negativas jurídicas no futuro para a direção, se aprovasse sozinho uma decisão que nunca havia passado pelo Conselho de Administração da Telebras.

A Nota Técnica é confusa e omissa, quando se trata de informar que “Diretriz 223” deveria estar em vigor, já que Rossetto admitiu que a empresa convivia na época com dois documentos, sendo um visivelmente falsificado, embora nunca tenha usado essa palavra. A Diretriz 223 foi criada e aprovada pelo Conselho de Administração da Telebras no dia 12 de novembro de 2010, na qual ficava estabelecido que a empresa pagaria a Gratificação PNBL aos funcionários e seus valores seriam reajustados conforme o estabelecido em Acordo Coletivo de Trabalho.

Ocorre que depois da saída de Rogério Santanna, em 1º de junho de 2011, na gestão de Caio Bonilha na presidência da Telebras (02/01/2011 – 14/01/2014), uma segunda “Diretirz 223” apareceu dentro da empresa, só que sem a cláusula de reajuste da gratificação.

Afinal de contas, qual a Diretriz teria de ser seguida, se ambos os documentos fossem verdadeiros? A Nota Técnica do gerente de RH, Vinicio Rossetto, deveria esclarecer essa dúvida para o diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com Investidores, Fabrício Santos Limoeiro. Mas no final embora tenha deixado transparecer que havia uma fraude em curso, sugeriu que a saída administrativa para o assunto era aprovar o documento falsificado, sem que houvesse a investigação de um crime.

Ao invés de deixar transparecer a existência de uma fraude em sua Nota Técnica, pois fora descoberta uma segunda Diretriz 223, suprimindo o reajuste na gratificação PNBL, que nunca foi assinada pelo ex-presidente Rogério Santanna, o gerente Vinicio Rossetto preferiu jogar na dubiedade da decisão. Ele apontou a existência de tal ato, mas ao invés de “cravar” que houve uma fraude documental, sugeriu que o documento falsificado fosse submetido ao Conselho de Administração, para garantir os seus efeitos do ponto de vista legal. Em outras palavras, Vinicio jogou o “pepino” para ser resolvido por instâncias superiores. 

Em sua Nota Técnica o Gerente de RH chega a mostrar as pistas de que a suposta Diretriz 223 falsificada foi criada para entrar em vigor na gestão do ex-presidente Caio Bonilha e lá ficou em vigor durante dois Acordos Coletivos de Trabalho. Sem reajustar a gratificação provisória PNBL de acordo com definido nos ACT da Telebras.

Por exemplo, Rossetto explica que a diretriz falsa passou a constar do banco de dados da Telebras a partir do dia 24 de maio de 2011. Segundo ele, essa informação fora fornecida pelos seus antecessores na Gerência de RH. Entretanto, nesta data Rogério Santanna ainda era presidente da Telebras e estava a apenas sete dias de ser demitido pelo ministro das Comunicações, Paulo Bernardo (1º/06/2011).

Procurado, Rogério Santanna disse que jamais alterou a Diretriz 223 aprovada pelo Conselho de Administração em novembro de 2010 e que a sua assinatura que consta num segundo documento falsificado foi obtida supostamente através de uma montagem em cópia xerox.

Rossetto poderia ter procurado na época Rogério Santanna para esclarecer o assunto. Isso porque, ele sabia que antes do dia 24 de maio, a diretriz que prevalecia no sistema da Telebras era a decisão original (Gratificação PNBL com reajuste obtido nas campanhas salariais). Se tivesse procurado Santanna, ele teria descoberto na hora o crime e teria a testemunha mais do que necessária para que a Telebras instaurasse um inquérito administrativo e punisse os responsáveis.

DEST

Ao contrário, para dar um ar de suposta correção na decisão administrativa, baseado num documento falso, o então gerente de RH, Vinicio Rossetto, sugeriu que a Diretriz 223 falsificada pelo menos cumpria uma determinação do então DEST – Departamento de Coordenação e Governança das Empresas Estatais. Segundo ele, o DEST apenas aprovou os valores fixos para a concessão da gratificação PNBL, que seriam de R$ 2 mil a R$ 3 mil, variando com o cargo do funcionário.

Ocorre que o DEST nunca se meteu em questões de reajuste de gratificações atreladas a salário, assunto que caberia à direção da empresa em discussões de Acordo Coletivo de Trabalho (ACT). Tanto, que o reajuste pode ter sido aplicado durante esse anos aos demais funcionários da Telebras que trabalhavam com o PNBL, mas foi feita uma “exceção” para os oriundos da Anatel. Um prejuízo estimado hoje em R$ 13 milhões.

Rossetto sugeriu que a Diretriz 223 falsa fosse submetida ao Conselho de Administração, como se fosse, uma “alteração” a ser aprovada pelos membros deste colegiado, pois desde a suposta data de 24 de maio estaria no sistema uma Diretriz falsa, contendo uma revisão que não foi aprovada por ninguém.

Legalização da fraude

O então presidente da Telebras, Caio Bonilha, submeteu ao Conselho de Administração da Telebras no dia 7 de agosto de 2012. Para que se chegasse a esse ponto, uma sucessão de fatos estranhos ocorreram dentro da empresa, que fogem a compreensão sobre padrões de comportamentos administrativos em Sociedades Anônimas.

Conforme dito acima, o Memorando 118/2012/2500 do então diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com os investidores, Fabrício Santos Limoeiro, foi encaminhado à área jurídica da Telebras com data do dia 3 de agosto de 2012. Porém, consta que foi recebido pela Gerência Jurídica da Telebras às 10h48 minutos do dia 6 de agosto de 2012, sendo em seguida recebido pelo Advogado Cirineu Roberto Pedroso às 11h06 minutos.

A partir de então deu-se um milagre, que somente os deuses da banda ultralarga poderão explicar algum dia o ocorrido.

A análise da Gerência Jurídica da Telebras sobre o tema ocorreu em tempo recorde. Aparentemente entre as 11h06 minutos do dia 6 de agosto e 15h30 minutos do dia 7 de agosto.

Após este período, o documento saiu das mãos da Gerência Jurídica na forma de um parecer emitido no dia 7 e foi encaminhado como resposta para o diretor Administrativo-Financeiro. Este recebeu a orientação juridica e na mesma hora repassou para o presidente da Telebras, Caio Bonilha. Isso porque, no mesmo dia 7 de agosto de 2012 estava marcada para as 15h30 minutos a reunião do Conselho de Administração, na qual aprovou, sem ler, um documento falso, mas que supostamente tinha um parecer juridico garantindo a sua autenticidade legal.

O único conselheiro que não votou foi Selvino Vergilio Bento, porque como representante dos funcionários no Conselho de Administração, sua presença foi interpretada como conflito de interesse. Se tivesse participado da reunião, certamente Selvino teria denunciado a fraude documental.

Não se tem notícias de que algum Conselho de Administração de Sociedades Anônimas tenha feito reuniões para aprovar matérias de caráter administrativa-financeira, sem que os conselheiros tomassem conhecimento prévio, com pelo menos sete dias de antecedência, sobre o teor das mudanças que estariam para serem feitas na empresa e que exigiriam a sua aprovação.

Entretanto, na Telebras, um documento que chega no dia 6 de agosto de 2012 na Gerência Jurídica, ganha um parecer relâmpago – assinado pelo gerente jurídico Marcio Antonio Rodrigues dos Santos – e é remetido de volta no dia 7 de agosto para a direção Administrativa-Financeira. Que no mesmo no dia encaminha a resposta para o presidente da Telebras, Caio Bonilha, que na mesma data envia para ao Conselho de Administração e este também no dia 7 de agosto aprova a mudança, sem sequer ter lido com antecedência sobre o quê se tratava a proposta.

Há que se perguntar ao presidente do Conselho de Administração da Telebras, que na época era o ex-secretário-executivo do Ministério das Comunicações, Cesar Alvarez, sobre como ele aceitou colocar em votação um documento que sequer tinha lido, assim como os demais conselheiros?

E aproveitar para perguntar como Alvarez não foi capaz de enxergar que estava rejeitando em 2012 um reajuste, que a própria empresa aceitou pagar em 2010. Data em que não por acaso ele também era presidente do Conselho de Administração da Telebras.

Por fim, também caberia indagar sobre como ele não viu que a proposta de rejeição do reajuste constava numa diretriz, que teria sido assinada por um presidente que já havia deixado a empresa um ano antes.

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