Eleições, fake news, golpismo e ISPs
Ao assumir a presidência do TSE, o ministro Alexandre de Moraes prometeu, em seu discurso de posse, que a Justiça eleitoral “terá coragem para lutar contra as forças que não acreditam no estado democrático de direito” e que haverá intervenção firme e ampla para se coibir a divulgação de notícias falsas.
Parte dessa determinação foi observada no mandado de busca e apreensão expedido por Moraes no final de agosto contra empresários que, em grupo no WhattsApp, defendiam um golpe de Estado caso o resultado das próximas eleições divergisse de suas preferências. Outra parte, ainda aguardada, é a proliferação de bloqueios e outras punições a sites e perfis em redes sociais dedicados à proliferação de fake news as quais, até agora, partiram principalmente do próprio ministro antes que estivesse à frente da Justiça eleitoral.
Nesses casos, quase sempre, o cumprimento das medidas passa necessariamente pelos provedores de Internet. Exemplo disso é uma decisão do próprio Moraes, tomada em março. Por conta de o Telegram, em desacato a determinações judiciais anteriores, não ter bloqueado a monetização de contas vinculadas ao blogueiro Allan dos Santos, o ministro proferiu decisão em que obrigava empresas que administram serviços de acesso a backbones no Brasil a inserir obstáculos tecnológicos capazes de inviabilizar a utilização do aplicativo.
O presidente do TSE mandou a Anatel retirasse do ar o site www.allandossantos.com, mantido por Santos. Para que a decisão fosse cumprida, a agência enviou ofício às empresas prestadoras de SMP e SCM comunicando a determinação judicial que ordenava a suspensão integral e imediata do funcionamento do site em todo território nacional.
Adiante, a Anatel encaminhou novo ofício aos ISPs, novamente com cópia de decisão judicial, determinando a adoção de providências semelhantes para que os sites www.gdoplay.com e www.artigo220.com não pudessem mais ser acessados em todo o país. Em casos desse tipo, os provedores de Internet ficam obrigados a inserir todo e qualquer obstáculo que esteja ao seu alcance para inviabilizar acessos a sites alvos de decisões judiciais.
Um endereço pode ser bloqueado a partir de seu IP ou do domínio. É uma ação que demanda cautela, pois alguns sites compartilham o mesmo IP e o bloqueio feito desse modo pode afetar o acesso a endereços não citados na determinação judicial. A melhor alternativa é fazer a ação a partir do domínio. Nesses casos, provedores devem usar seus servidores DNS para criar os bloqueios necessários para que o domínio alvo da determinação judicial não tenha seu IP traduzido para o cliente final, impedindo, assim, que seu conteúdo seja acessado.
Decisões judiciais dessa natureza, que antes eram proferidas quase que exclusivamente pelo STF, devem surgir também, e, possivelmente, em grande número, a partir do TSE. As empresas que administram serviços de acesso a backbones no Brasil e mesmo que prestam SCM, como os provedores de Internet, têm de cumpri-las, caso contrário, ficam sujeitas a medidas coercitivas, como multas diárias.
(*) Maria Clara Souza Baroni é advogada e integrante do departamento jurídico da VianaTel, empresa especializada em consultoria regulatória para provedores de Internet.