O combate ao spoofing e as novas obrigações das operadoras de telefonia
Ao responsabilizar os fornecedores de STFC e SMP pelo monitoramento de suas redes e de seus códigos numéricos, a Anatel passará a ter conhecimento de infrações que antes não teria como identificar. Ainda que louvável, a iniciativa limita-se à telefonia. Espera-se que ações semelhantes do regulador tenham como alvo golpes aplicados por meio de falsificação de identidade – característica principal do spoofing – por exemplo, na Internet.

Por Fabio Vianna Coelho (*)
Ligações que caem segundos após serem atendidas e que utilizam códigos alterados para impedir a identificação de sua origem resultam geralmente de disparos maciços que geram grande volume de queixas de usuários e servem para a prática de diversos golpes. Iniciado há anos, o combate da Anatel ao chamado spoofing ganhou novos contornos a partir de seu despacho 262/2024/COGE/SCO. Encaminhado em setembro às prestadoras de serviços de telefonia fixa e móvel, torna os detentores de recursos numéricos responsáveis pelo monitoramento do tráfego de suas redes e traz novas obrigações regulatórias, além de modificar uma prática comum no mercado.
Inicialmente, as determinações trazidas pelo documento causaram apreensão, inclusive em grandes operadoras, já que, teoricamente, não são elas os infratores, e sim as empresas que realizam ligações irregulares e em quantidades abusivas. Porém, o que se observa é que a Anatel atacou o problema forçando os que detêm o chamado recurso numérico a monitorar seu uso e suas redes, criando novas regras, cujo descumprimento caracteriza infração sistêmica, podendo gerar multas de até R$ 50 milhões.
A fim de intensificar o acompanhamento dos que adotam postura inadequada quanto ao uso da telefonia, a agência estabeleceu que apenas detentoras de recurso de numeração podem fornecê-lo a usuários do serviço, o que põe fim a uma prática comum no mercado. Por implicar em um processo burocrático, grande número de prestadoras de telefonia que não possuem interconexão optavam, ao invés de adquirir o sistema, por utilizar o de outras, via contratos de cessão, para revendê-lo ou alugá-lo a terceiros.
A partir do despacho, a cessão de uso/intermediação de recurso de numeração torna-se “irregularidade regulatória” que deve ser encerrada ou adaptada, inicialmente, a partir de alteração contratual. Prestadoras que atuavam dessa forma podem transferir os números fornecidos pelas antigas detentoras para suas redes, a partir da portabilidade numérica. A agência também determinou o fim da comercialização e do fornecimento de serviços que omitem, alterem ou possibilitem a mudança do código originador e de recursos de capacidade de geração de chamadas.
Para as prestadoras, ficam estabelecidas obrigações permanentes, como o monitoramento constante do tráfego de chamadas que seus clientes, sobretudo corporativos, fazem a partir de suas redes. Quando estas observarem algum abuso, devem providenciar a notificação do assinante. Havendo continuidade ou reincidência das infrações mencionadas acima, os contratos deverão ser revogados e o fornecimento dos serviços, suspenso, o que deverá ser tema de notificação à Anatel.
A identificação dessas e de outras irregularidades se dará a partir da varredura que as empresas terão de realizar a cada quinze dias do tráfego percebido. A cada avaliação, as que registrarem encaminhamento de chamadas com códigos irregulares não atribuídos, vagos, em quarentena ou inválidos superior a 10% do seu tráfego – classificadas como operadoras ofensoras – deverão adotar as medidas cabíveis tanto em relação ao infrator quanto junto à agência.
Embora o despacho mencione os casos em que a Anatel deve ser notificada, essa comunicação se dá, de fato, a partir de uma nova obrigação regulatória, o Relatório de Tráfego e Suspensão, também chamado Coleta de Interconexão. Apesar de o documento estabelecer até o 15º dia de cada mês como data para o envio, na prática, isso só ocorrerá em períodos em que houver notificações a ofensoras e/ou suspensões. Isso porque, inicialmente, o sistema coletas da agência não possibilita, nesse caso, o envio de arquivos em branco ou zerados.
O despacho 262/2024 é, por ora, a mais efetiva ação da Anatel para o combate ao spoofing. Ao responsabilizar os fornecedores de STFC e SMP pelo monitoramento de suas redes e de seus códigos numéricos, a agência passará a ter conhecimento de infrações que antes não teria como identificar. Isso amplia seu leque de atuação para coibir práticas irregulares. Ainda que louvável, a iniciativa limita-se à telefonia. Espera-se que ações semelhantes do regulador tenham como alvo golpes aplicados por meio de falsificação de identidade – característica principal do spoofing – por exemplo, na Internet.
(*) Fabio Vianna Coelho é sócio da VianaTel, consultoria especializada na regularização de ISPs, e do RadiusNet, software de gestão para provedores.