
O relatório do escritório de comércio vinculado ao governo dos Estados Unidos, USTR, que serve como base para as tarifas retaliatórias anunciadas por Donald Trump, reserva seis de suas 397 páginas ao Brasil. O documento faz críticas não apenas a tarifas de importação sobre produtos como etanol, filmes, bebidas alcoólicas e carne suína, mas também regulações brasileiras em setores estratégicos, como telecomunicações e proteção de dados. As tarifas de Trump serão anunciadas na quarta, 2 de abril.
No terreno das telecomunicações, o relatório destaca as restrições brasileiras à operação de satélites estrangeiros, que só podem atuar no país mediante direitos não exclusivos (“landing rights”), concedidos pela Anatel por prazos limitados (até 15 anos) e reclama de taxas mais altas do que as aplicadas a empresas nacionais. Para o governo americano, essa política privilegia operadoras locais e dificulta a entrada de companhias como SpaceX e Amazon, que buscam expandir serviços de internet via satélite no Brasil.
Além disso, o relatório menciona a discussão em curso na Anatel de estabelecer alguma forma de cobrança às grandes plataformas digitais pelo uso das redes das teles que operam no Brasil — medida que empresas de tecnologia dos EUA veem como uma taxação disfarçada que pode encarecer serviços para usuários e reforçar o monopólio das teles brasileiras.
Outro alvo é a Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 113.709/18), cujas regras para transferência internacional de dados pessoais, publicadas em agosto de 2024, são vistas como um entrave para empresas americanas. O relatório aponta que a demora na implementação de mecanismos como certificações e cláusulas contratuais gera insegurança jurídica e atrapalha negócios digitais. Os EUA pressionam o Brasil para flexibilizar essas normas, argumentando que elas podem ser usadas como barreiras não tarifárias.
Trump tem afirmado que usará o relatório para justificar tarifas retaliatórias contra diferentes países, Brasil inclusive, seguindo uma suposta política de “reciprocidade”. Produtos brasileiros como aço, suco de laranja e café podem ser os primeiros da lista, mas o impacto pode ser ampliado se setores de tecnologia e telecomunicações forem incluídos.