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Briga de teles e torreiras no STF: planejamento urbano contra disputa de preços

Torreiras alegam que multiplicação de torres prejudica o setor e as cidades, enquanto teles acusam monopólio

As big teles e as big torreiras que atuam no Brasil se digladiam no Supremo Tribunal Federal sobre a exigência, ou não, de uma distância mínima de 500 metros para a instalação de novas torres que suportam as antenas de celular.

As torreiras independentes alegam que a restrição, criada em 2009, em tempos de pânico porque celular causaria câncer, se mostrou benéfica ao impedir a multiplicação desordenada dessas estruturas no espaço urbano.

“Apesar da questão da radiação ter sido superada pela própria Organização Mundial de Saúde, a lei não está obsoleta. Porque na hora que começar a ter uma torre ao lado da outra, o problema urbanístico que tínhamos naquela época, com duas ou três torres em cada bairro, será recriado. E a tendência é se recriar uma resistência às torres”, diz Luciano Stutz, presidente da Abrintel, entidade que representa três das principais torreiras independentes – American Tower, QMC e SBA, que juntas detém 54% desse mercado.

As maiores operadoras móveis do país, Vivo, Claro e TIM, por meio de seu sindicato nacional Conexis Brasil Digital, sustentam, ao contrário, que a restrição prejudica a ampliação do 5G no país, ao dificultar a construção de novas estruturas de suporte aos equipamentos.

“A limitação de novas torres no raio de 500 metros limita a conectividade, limita o uso do 5G. E pode atrapalhar a universalização do serviço em determinadas regiões”, rebate o diretor regulatório da Conexis, Fernando Soares.


Mas em que pese os nobres argumentos de parte a parte, há sinais de que o STF foi chamado a arbitrar uma disputa de preços.

Essa disputa ganhou contornos constitucionais por conta de um artigo incluído na Medida Provisória 1018/20, que, criada para tratar de desoneração tributária para conexões via satélite, agasalhou uma emenda que revogou o artigo 10 da Lei nº 11.934/09 – justamente o artigo que exigia uma distância mínima de 500 metros entre as torres.

Esta lei trata dos limites à exposição humana a campos eletromagnéticos e, como mencionado, nasceu pelo temor de que celular fazia mal à saúde. Ela não foi a única e até hoje centenas de legislações municipais restringem a instalação de antenas de celular no que é considerado pela Anatel o maior obstáculo à cobertura móvel.

No momento, o placar no STF está 3 a 1 em favor das teles. Para o relator, Flávio Dino, a MP 1018/20 misturou tema indevido ao revogar o raio mínimo de 500 metros. O presidente do STF, Luis Roberto Barroso, entendeu a restrição como obsoleta e foi acompanhado por Gilmar Mendes e Cristiano Zanin. a ADI 7708 está no Plenário virtual com data prevista de encerramento em 14 de março.

Preços em queda

Questionadas sobre o impacto da Medida Provisória no mercado, as teles admitem que houve um ganho econômico para o setor. “O preço do uso das torres caiu em comparação com os índices de preços da economia. De 2021 para 2024 o preço caiu 25,7%”, afirma o diretor regulatório da Conexis.

As torreiras alegam que a variação alegada pelas teles é fruto de um levantamento limitado no tempo sobre contratos de 20 anos. “O que elas não mencionam é que os contratos de torres foram feitos inicialmente com correção pelo IGP-M, que é muito mais volátil que o IPCA”, diz o presidente da Abrintel.

As próprias torreiras admitem que, com o fim da restrição de 500 metros, pelo menos duas empresas de torres foram estimuladas pelas teles móveis a construir novas estruturas, mas cobrando preços mais baixos. “Em 2022, quando cai o preço, são contratos com torres que foram colocadas ao lado das já existentes”, reconhece Stutz.

A Abrintel ingressou com a Ação Direta de Inconstitucionalidade 7708 no STF sob alegação de que a revogação dos 500 metros pela MP 1018/20 foi um jabuti, um corpo estranho com assunto distinto ao que a Medida Provisória se destinava – e, portanto, deve ser considerada ilegal, com a restauração automática do raio mínimo para novas torres.

As teles, por sua vez, aumentaram o tom sobre impacto concorrencial. “Na hora que estabeleço esses 500 metros de raio, estabeleço juridicamente uma prática anticompetitiva, gerando barreira à entrada de outas torreiras. Qual o problema de colocar outra torre e aumentar a competição? Concorrência é bom em qualquer mercado. Restabelecer a prática cria monopólios locais de determinadas empresas”, alega a Conexis.

O problema é que o argumento concorrencial pode se voltar contra as próprias teles. A Abrintel sustenta que a concentração está ao lado dos compradores de espaço nas torres. “São 13 torreiras independentes atuando no Brasil, contra apenas três operadoras móveis de abrangência nacional, um cenário que se agravou com o fim da Oi Móvel”, lembra Stutz.

A maior ironia é que o Brasil se tornou um dos maiores mercados globais de torreiras independentes – cerca de 75% das 70 mil torres do país são dessas empresas – por um movimento das próprias operadoras móveis. Em tempos de vacas magras, com 4G consolidado e 5G ainda uma promessa, venderam a maior parte das torres que detinham e terceirizaram o mercado.  

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