Internet

STF adia julgamento do Marco Civil e pede órgão como CGI.br para regular plataformas digitais

"Só estamos atuando porque não há lei e precisamos de um regime jurídico", disse Luís Roberto Barroso

O Supremo Tribunal Federal deixou para 2025 a conclusão do julgamento sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet, e portanto provoca uma interpretação sobre os limites da responsabilidade das plataformas digitais sobre o conteúdo postado pelos usuários.

Após os votos dos relatores dos dois recursos extraordinários que trazem o tema ao Supremo, José Dias Toffoli e Luiz Fux, o presidente Luís Roberto Barroso apresentou um voto-vista e abriu divergência. Ele entende que não há responsabilidade objetiva das plataformas pelo conteúdo de terceiros. Mas ela é maior nos casos de conteúdo impulsionado. Ao contrário dos colegas, Barroso defendeu a manutenção do artigo 19, por entender que há muitos casos em que é preferível uma avaliação do Judiciário sobre a remoção de conteúdo.

“Considero que o artigo 19 é apenas parcialmente inconstitucional, pois é legítimo que, em muitas situações, a remoção de conteúdo somente deva se dar após ordem judicial”, disse Barroso. Em especial, apontou, nos crimes contra a honra. Daí a posição de que “sempre que existir dúvida razoável sobre a licitude ou não de uma manifestação, deve se sim esperar uma ordem judicial”.

O julgamento foi suspenso por um novo pedido de vista, feito pelo ministro André Mendonça – a dois dias do recesso judicial, significa que a conclusão ficou para 2025.

O adiamento veio acompanhado de um apelo do Supremo para que o Congresso Nacional avance em um consenso mínimo para uma legislação específica sobre regulação das plataformas digitais. Em especial, sobre o dever de cuidado das plataformas e mitigação do risco sistêmico de conteúdos indesejados.


“Todos aqui desejamos e estamos fazendo um apelo ao legislador para que regulamente as hipóteses em que a proteção de valores constitucionais relevantes deve ser feita de ofício, em alguns casos, ou mediante mera notificação privada, em outros casos, e em outros ainda, a notificação judicial. É isso que precisamos que o legislador faça. Que eleja os bens jurídicos específicos que se quer tutelar e o tipo de comportamento que vai se exigir das plataformas a cada uma dessas situações”, disse o presidente do STF.

Para ele, a lei deve criar um ente multissetorial, nos moldes do CGI.br, para cuidar do assunto. “Faço apelo ao legislador para que discipline e crie um órgão próprio para o papel de monitoramento e eventual sancionamento dos comportamentos indevidos. Um órgão que não deveria ser estatal. Melhor um órgão independente, algo próximo do Comitê Gestor da Internet, com representantes do governo, das empresas, da sociedade civil, do Congresso, com competência para monitorar a rede, recomendar comportamentos e eventualmente aplicar as sanções.”

“Todos esperamos que, oportunamente, e respeitamos o Congresso Nacional e as dificuldades de consenso nessa matéria, mas só estamos atuando porque ainda não há lei e precisamos criar um regime jurídico para esse tema”, disse Barroso.  

Em síntese, o voto propõe que:

1) O artigo 19 é insuficiente, mas não deve ser eliminado. As exceções para a aplicação da regra do artigo 21 devem ser ampliadas. Esse é o ponto central do meu voto;

2) A responsabilidade por conteúdos de terceiros deve ser subjetiva e não objetiva. Em caso de dúvida, cabe ao Judiciário decidir;

3) As plataformas devem ter o dever de cuidado para mitigar riscos decorrentes de atuação criminosa ou gravemente lesiva à sociedade.

Esse dever de cuidado exige algum nível de monitoramento e a publicação de relatórios de transparência. Nas palavras do presidente do STF, “provedores têm o dever de cuidado de mitigar os riscos sistêmicos criados ou potencializados pelas suas plataformas. Devem atuar proativamente, de ofício, para que seu ambiente esteja livre de conteúdos gravemente nocivos, em especial:

  1. pornografia infantil e crimes graves contra crianças e adolescentes;
  2. induzimento, instigação, ou auxílio a suicídio ou automutilação;
  3. tráfico de pessoas;
  4. atos de terrorismo;
  5. abolição violenta do estado democrático de direito e golpe de Estado.

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